Ecos do Passado
Vamos postar uma saga que ainda não foi concluída pelo meu amigo Professor Paulo Henrique Câmara que me deu a liberdade de criar um dos mutantes mais queridos do meu Universo Dm.... Paulo Henrique Marx, codinome Balão e atual candidato ao governo do estado do RN.
Depois vou postar seu arquivo secreto;
Agora vamos ao que interessa:
Uma história de Paulo Henrique Câmara fora da cronologia do Dm, mas situada entre as Sagas do Clã Evolução do mal e do CRM...
PRÓLOGO
Verdades Reveladas
A Corporação Marx é, hoje, uma das maiores empresas particulares do planeta. Somando suas atividades em robótica, eletrônica e produção armamentista a CoMarx fatura cerca de 100 milhões de dólares mensalmente.
Entretanto, tal faturamento não é utilizado apenas para engordar os bolsos de Paulo Henrique Marx e seus associados. Boa parte deste dinheiro é destinado a casas de apoio a drogados, manicômios – principalmente o de Macaíba –, reflorestamentos, assistência a crianças abandonadas e, em parceria com a UFRN, pesquisas para a melhoria do meio-ambiente.
Nesse ramo, a CoMarx mantém três subsidiária: a AfrincanLIVE, em Ruanda, no continente africano; a Biosphere Modify, na Europa Central e a AmbiGen, na América do Sul, Brasil, mais precisamente em Natal, capital do estado mais desenvolvido do país, o Rio Grande do Norte.
E é justamente na AmbiGen que nossa história começa.
Entrar na empresa é a certeza de deparar-se com 180 funcionários jovens em processo de estágio gerado pela parceria CoMarx/UFRN, todos trabalhando com as mais diversificadas e variadas espécies de plantas, procurando dar o melhor de si para que o planeta sobreviva ao que o homem , no geral, vem lhe fazendo. Um grupo de 20 cientistas de genética ambiental é quem serve de professores e orientadores para os estagiários. É comum acontecer de alguns estagiários depois virem a se tornar contratados da CoMarx como biólogos, geneticistas, oceanógrafos e tantas quantas forem as possibilidades científicas a serem exploradas.
No entanto, quem “manda” na AmbiGen é o biogeneticista e físico nuclear Rafael Belmont. Formando o conclave do círculo interno, mas abaixo de Belmont, encontramos Erick Miller – PhD em Eletrogenética; Janete Van-Hugges – PhD em Biologia Marinha e Ecossistemas; as gêmeas Illia e Marya Kurkova – Especialistas em Robótica e Informatização; e, por fim, Marcos Aguiar – PhD em Engenharia Genética.
Apesar da notável variação lingüística e étnica existente, afinal, Belmont é francês, Erick e Marcos são brasileiros, Hugges é holandesa e as irmãs kurkova são russas, a comunicação entre eles é absolutamente perfeita.
Porém, a verdade por trás da AmbiGen está longe de ser aquela que está a vista. Distante dos olhos de todos e servindo de jarro para uma samambaia geneticamente modificada colocada em uma estufa de vidro, onde só entram o doutor Belmont e o conclave interno, encontra-se um simplório interruptor que revela o que realmente é o laboratório de pesquisas ambientais no Brasil. Ao simples estalar do “click” do interruptor, portas metálicas milimetricamente camufladas na estufa de vidro se abrem revelando um enorme e muito bem projetado laboratório subterrâneo. Um elevador equipado com a mais alta tecnologia já produzida pela CoMarx é o convite de entrada para o mundo por trás da AmbiGen. Totalmente feito em acrílico, com painel de controle virtual e um mecanismo completa e absolutamente silencioso, o veículo locomotor é a única forma de descer e subir os três andares subterrâneos.
Ah, caros leitores, vocês acham que os andares subterrâneos são a continuação do laboratório de pesquisas biológicas e ambientais? Ledo engano. O complexo é utilizado para a pior forma de atrocidade que possa existir: pesquisas e genemodificações em cobaias humanas. Perto do que é feito nos secretos subterrâneos do laboratório da AmbiGen, o holocausto nazista é brincadeira de criança.
No 1º andar, uma área circular de cerca de 40 metros de raio, há um grupo de homens armados até os dentes, separados a perfeita distância de 3 metros cada, com ordem de matar qualquer um sem autorização ou que ultrapasse a chamada “Linha Verde”, um espaço que pré-determina quem vive e quem está passível de morrer. Uma espécie de arena baixa toma parte da área central, paredes de molibdênio circundam-na, um teto transparente formado a partir de um polímero extremamente flexível e resistente retirado da casca do ananás silvestre – o famoso abacaxi – recobre-a. O local está vazio, no entanto, a atmosfera e a ambientação podem ser imediatamente geradas a partir de imagens holográficas polidimensionais. É o campo de testes de Belmont e seu conclave interno. Na visão oposta, encontra-se a sala de monitoramento, de lá são acompanhados e analisados os testes nas cobaias.
No segundo andar do laboratório, encontram-se as salas de operações, os tanques de transfusão e o computador central da AmbiGen. Mas é no terceiro andar que o horror realmente começa. Aqui se encontra o calabouço onde ficam acomodadas as cobaias para as experiências genéticas. Horrores inimagináveis são cometidos aqui.
Agora, imaginemos que um sujeito que possui o próprio grupo de superseres e se autodenomina herói deve, na verdade, ser o maior hipócrita e crápula mentiroso que existe... é! Deveria ser, mas não é!!! Na verdade, tudo que ocorre nos subterrâneos da AmbiGen é mantido num sigilo tão absoluto que nem o próprio presidente da Corporação Marx, Paulo Henrique Marx, sabe que o laboratório de pesquisas ambientais no Brasil é utilizado para fazer experiências de alterações genéticas e eletrônicas em seres humanos.
CAPÍTULO 1 – Incidente
19h
Laboratório de Pesquisas da AmbiGen, Natal, Brasil.
A noite está tranqüila, o céu claro e límpido, dá até para contar as estrelas. José Maria de Souza, o vigia do laboratório, lacra a última porta, olha pacientemente o seu relógio, são 19:02h, suspira... vai ser mais uma monótona noite . “Melhor assim!”, pensa ele, lembrando do último vigia a trabalhar na AmbiGen que fora afastado sem justa causa. Mudou-se. Dizem que está morando em Picos, no Piauí. Longe. Muito longe.
“Melhor assim! ... ... É... ... ... Melhor assim” – Pondera Zé Maria enquanto caminha suavemente entre as plantas do laboratório, assoviando uma canção de Roberto Carlos e lembrando que o seu colega de profissão começou a insistir que estava escutando estranhos barulhos durante a noite. Deram-lhe as contas e depois se mudou.
“Estranho! Mateus adorava Natal. Então por que ir embora tão repentinamente?... Sei lá!? Eu acho melhor parar de pensar nessas bobagens”. Absorto em seus pensamentos, Zé Maria continua o seu trabalho.
Há três meses apenas ele estava desempregado. A mulher o abandonara a quase um ano por causa da bebida, também por causa da bebida perdera o último emprego, os filhos não faziam questão de vê-lo. Rejeitado e abandonado, só restava a Zé Maria o consolo da morte e era exatamente o que ele estava se preparando para fazer: colocou o cano longo do revólver calibre 38 em sua própria boca. De repente, prestes a atirar, palmas... era na sua porta... mais palmas, não ligou, era um cobrador, logo iria embora, mas ele não devia a ninguém... mais palmas... parou e pensou um pouco... a pessoa que batia palmas defronte a sua casa insistia... resolve então atender. Era o seu vizinho, um doutor. Não se lembra do quê, mas sabe que ele era um doutor. Nunca foram próximos. Conversaram? Nunca. No máximo trocaram “bons dias” soltos em encontros casuais. Agora estava ele ali, parado a sua frente com um envelope na mão direita e um sorriso repleto de vida que incomodava Zé Maria.
─ Bom dia, vizinho. Me disseram que você já trabalhou de vigia...
─ É verdade! – responde seu Zé ríspido e seco entrecortando a fala do momentaneamente indesejado visitante e continua – mas estou desempregado agora.
E vai vagarosamente fechando a porta. O vizinho segura-a colocando seu pé entre a caixa e a porta:
─ Tenho uma oferta de trabalho para o senhor.
─ Para mim?
─ Sim! O senhor não é... – olha no envelope.
─ José Maria de Souza.
─ Isso mesmo, tome seu José.
─ Pode chamar de Zé Maria como todo mundo. – retruca enquanto olha o envelope.
O olhar do desempregado perde-se ao ver a logomarca do laboratório em que tanto sonhara trabalhar, a felicidade torna-se maior ainda quando, junto ao símbolo do laboratório da AmbiGen, paira o símbolo da CoMarx.
Parou de beber, os filhos ainda não o procuram, nem a mulher. Mas isso não importa, pois existe respeito no trabalho, com os amigos, com os patrões. O respeito da família? É só uma questão de tempo.
Sua mente volta ao presente, um leve sorriso banha sua face ríspida a austera. Um leve sorriso que, aos poucos, vai desaparecendo diante de uma luz vermelha que pisca incessantemente. Em seu último ato, o vigia leva a mão ao coldre e... ... ... Desaparece num piscar de olhos.
Uma luminescência azulada banha todo o laboratório térreo da AmbiGen e, quando a estranha luz se desfaz, não há vestígios de nada vivo no que antes era o maior reservatório de plantas, a mais diversificada biosfera laboratorial da América Latina.
Vazio...
Lúgubre e silencioso vazio, desfeito apenas pelo singelo ruído do tic-tac de um relógio que paira sobre a porta de entrada do laboratório.
São 19:25h.
● ● ●
07:10h
Residência de Marília Graziele, Alecrim, Natal
Um despertador toca pela quinta vez... os olhos cansados se abrem.
— Puta que pariu!!! Eu tô atrasada!!! Se “seu” Zé não me matar, o doutor Belmont me despede... Puta que pariu!!!
— Calma, gata
— Não da pra ter calma
— Seu horário não é só as 8. Pô, tem calma.
— Calma o cacete, Daniel eu tenho que abrir o laboratório antes da chegada de todo mundo.
— Pô, Marília, ainda são 7:12h. Dá um tempo.
— Eu tinha que ta lá às 7h.
Essa vai ser a terceira vez que Marília Grazielle chega atrasada. Na primeira vez apenas olhares severos. Na segunda uma advertência:
— Se a senhorita chegar atrasada mais uma vez será despedida.
— Desculpe, Dr. Belmont. E que...
— Em nosso meio de trabalho, mocinha, não a espaço para desculpas ou erros. Passar bem!
Num cochicho quase inaudível, enquanto o Dr. Belmont se retira, Marília fala para Zé Maria, o homem que nos últimos dois meses tem sido o pai que ela nunca teve:
— Que homem grosso e estúpido!
— Mas ele tem razão, menina Marília, nesse ramo, o erro é fatal e a desculpa, inaceitável.
Inaceitável. A palavra reverbera na mente de Marília enquanto ela cata suas coisas e rapidamente se veste.
7:18h. Correndo, Marília sai de casa e agradece o fato de sua casa ser no mesmo bairro que o laboratório.
7:23h. Marília entra na rua da AmbiGen. “Que estranho...” pensa ela “Seu Zé deveria estar do lado de fora, me esperando... o que aconteceu?”
7:24h. A porta principal esta trancada, ninguém responde. Bate forte, nada acontece. Clama por “seu” Zé Maria. Nada.
Em seu último ato, Marília encosta o ouvido junto a porta, a fim de tentar ouvir algo... Um leve sibilo ssssss...
Booooooom!
São 7:25h.
Capítulo 2 – Investigação
Um interfone impaciente acorda um homem muito cansado.
— Sr. Marx! Sr.Marx! Acorde, por favor.
— O que foi, Micarla? - Pega o relógio, na cabeceira, são 8 horas – deve ser urgente pra você me acordar essa hora.
— Senhor Marx, ligue a TV já.
— Por quê ?
— Ligue e o senhor verá.
— Tá! Tá! Não precisa gritar! Eu tô ligando. Mãos adormecidas caçam o controle remoto da TV enquanto os pensamentos de Paulo Henrique Marx se preenchem de dúvidas.
O click da TV em resposta do sinal do controle pega o diretor-presidente da corporação Marx de calças curtas
— Estamos aqui, ao vivo, do local onde antes havia o renomado laboratório de pesquisas ambientais conhecido como Ambigen. Os bombeiros tentam apagar o incêndio que já dura quase 40 minutos. Constantes explosões impedem que os guerreiros do jogo consigam se aproximar do local onde o foco de incêndio parece maior, o segundo andar subterrâneo da AmbiGen. Até o momento não foram encontrados vestígios de seres vivos na área do laboratório. Confirmada mesmo, apenas uma vítima fatal: A bióloga Marília Grazielle, de 23 anos. Fora encontrada do lado de fora do laboratório com queimaduras em 70% do corpo, faleceu antes que os paramédicos pudessem ajudá-la.
— Srta Micarla?
— Sim, senhor Marx!
— Chame Comando, Mimic, Gnomo e Anjo caído.
— Mas senhor, chamar sua elite de guarda-costas e a suprema força? Por quê ?
— Quando eles chegarem, você saberá. Chame-os aqui, imediatamente.
— Claro, senhor Marx.
Enquanto veste seu uniforme e escolhe um terno para a bomba que está prestes a explodir, Paulo pensa e categoriza as melhores respostas para serem dadas a imprensa. Com uniforme vestido e o terno na mão, ele apanha novamente o controle
“Click”
—... Os bombeiros ainda não sabem as causas das constantes explosões, mas supõem que seja um vazamento de gás, visto que um sibilo como o de vazamento do gás sempre antecede as explosões.
— Senhor Marx
— Sim Micarla
— Coloque no canal 17, senhor.
— 17 ?
— Sim.
“Click”
— ... A morte da bióloga Marília Grazielle, vítima da explosão do prédio da Ambigen. No entanto, não é esse apenas o primeiro fato estranho, alguns moradores da redondeza dizem que, durante a noite, uma estranha luz azul partiu do prédio uma enorme redoma azulada e, simplesmente, desapareceu, alguns segundos depois.
Não é a primeira vez que estranhos boatos circundam a Ambigen, a cerca de quatro meses um de seus funcionários, o vigia noturno, Emanoel Góes, desapareceu repentinamente após ter dito que escutava estranhos barulhos vindo da parte de baixo do laboratório.
“click”
— Srta Micarla?
— Sim senhor! Ah, senhor, Luciano, Renato e Carlos Eduardo já chegaram.
— Ótimo. Mande-os subir. E marque uma coletiva com a imprensa para as dez horas.
— Mas, senhor Paulo, e a reunião com o senhor Gates?
— Pode esperar. O assunto aqui é mais urgente.
— Tudo bem, senhor... comando acaba de chegar. Estou mandando-o subir.
— Ok.
Enquanto aguarda seus comandos, Paulo procura pelos papéis que selaram a parceria com a Ambigen e as fotos dos arquivos. Agora ele tem absoluta certeza de que há algo de errado, de estranho e familiar com aquele doutor que o procurou no período em que a Corporação Marx procurava parceiros pelo mundo afora.
“Encontrei...” em seus pensamentos, uma alegria inconstante. “Aqui estão. Agora vejamos: É preciso primeiro cruzar os dados e as depois as fotos para descobrir onde já vi aquele doutor, como era mesmo o nome dele? Ah, Belmont... Rafael Belmont.”
Enquanto coloca os arquivos no Marxnet e cruza com os dados do computador central do distrito mutante, Paulo Henrique Marx, o mutante BALÃO, recebe sua guarda de elite e o líder de campo da suprema força.
· · ·
— Bem, pessoal, aqui estão alguns dados e algumas informações sobre o que esta acontecendo.
Como vocês sabem, por volta das 7:25h da manhã de hoje, o prédio da AmbiGen, no Alecrim, foi pelos ares. Explosão criminosa? Não sei e, no momento, isso não vem ao caso. O que realmente importa é saber o que estava acontecendo na AmbiGen.
— Não entendi, senhor Marx.
— É simples, Comando. Até às 7:59h de hoje eu achava que a AmbiGen só mexia com plantas e só tinha o prédio básico. No entanto, a explosão revelou um complexo subterrâneo de cerca de três andares e, além disso, a explosão também revelou altíssima tecnologia. Parte disso já destruída , mas muito a vista como se pode perceber por estas imagens que vocês têm nessas pastas. Resumindo: não era só com meio-ambiente que a AmbiGen tratava.
Quero que vocês juntem forças, visto que grande parte da Suprema Força está de férias, e investiguem o que está havendo. Por enquanto, eu ficarei aqui. Logo, os urubus da imprensa ligarão a AmbiGen com a CoMarx e será preciso eliminar alguns inimigos televisivos.
Comando, conto com sua astúcia. Se precisar de algo, contate a tenente Thuanny Araújo.
— Sim, senhor! Vamos, rapazes.
A caminho, Comando explica o seu plano e parte, junto com Anjo Caído – codinome de Carlos Eduardo – para a academia central do Distrito Mutante; enquanto Ozenir Luciano, o Mimic, e Renato, o Gnomo, partem para o prédio da AmbiGen.
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9h
Academia CENTRAL do Distrito Mutante
Por trás da fachada de Academia Militar, existe um complexo que treina e ensina mutantes jovens a controlarem os seus dons. O nome CENTRAL significa CENtro de TReinamento ALfa.
No caminho, Comando contatou a tenente Thuanny e indicou-lhe três nomes de cadetes para que ajudassem na situação da AmbiGen.
Enquanto isso, na CoMarx, Paulo recebe uma ligação de uma preocupada tenente:
— Bom dia, Senhor Paulo!
— Bom dia, Tenente Thuanny.
— Senhor, minha ligação refere-se a um pedido de um de seus homens, o Comando.
— Sim...
— Ele pediu a liberação de três recrutas da CENTRAL e, perdoe-me a franqueza, mas eles não estão preparados para ações de campo.
— Tenha calma, tenente. Eu confio na decisão de Comando, se ele escolheu os tais três recrutas, é porque sabe que suas aptidões mutantes serão úteis.
— Mas, senhor, o mais velho deles tem apenas 18 anos.
— Tenente, nós não fomos ensinados a usar nossos poderes ou dons, aprendemos por conta própria. A vida nos foi professora e, como você sabe muito bem, começamos tão ou mais cedo do que eles. Esses garotos da CENTRAL têm uma enorme vantagem: controle, ensinamento e proteção. Confie em Comando e, além do mais, é só um mísero incêndio.
A suave, porém moderada, voz utilizada pelo Diretor-Presidente da Corporação Marx preencheu o coração preocupado da tenente Thuanny... um silêncio impera ao telefone até que é quebrado pela mesma terna e compreensiva voz de antes:
— Tenente?
— Tudo bem, senhor Paulo, o senhor me convenceu. Espero que nada de mal ocorra aos meus cadetes.
— Não se preocupe. Tem a minha palavra de que nada de mal acontecerá a eles.
— Obrigado, senhor!
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Longe dos olhos de Paulo, Comando e da tenente Thuanny uma explosão acontece acompanhada de uma estranha e bela descarga azulada que faz com que , diante das câmeras, dezesseis bombeiros desapareceram, assim como a famosa repórter Lidiane.
Mimic e Gnomo estavam acabando de chegar ao local e presenciaram o estranho fenômeno. Imediatamente, começaram a afastar as pessoas do local.
Após afastarem as pessoas para uma distância considerada segura, Gnomo passa a procurar pistas enquanto Mimic monitora as explosões.
Apesar do cuidado excessivo, uma coisa não foge à mente dos dois heróis: a estranha explosão azulada que eles presenciaram ao chegar e o sumiço dos bombeiros e da repórter. O que será que foi aquilo?
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10:03h
Edifício Vinícius Marx
Auditório Central da CoMarx
— Os repórteres?
— Estão aguardando e... senhor Paulo... eles estão muito agitados com tudo isso!
— Obrigado, Micarla! Bom saber que posso confiar em alguém... Bom!!! – Suspira e ajeita a gravata – Seja o que Deus quiser!
Paulo Henrique Marx caminha de forma consciente e segura em direção aos odiosos abutres da imprensa, suspira novamente, ajeita a gravata mais uma vez, e, quando abre a porta, é literalmente engolido por uma avalanche de repórteres que se empurram e se debatem tentando fazer seus microfones chegarem próximos do homem mais importante do Brasil, talvez do mundo.
Caminhando silenciosamente entre o turbilhão de repórteres, Paulo coloca-se na tribuna e testa muito pacientemente os microfones. O silêncio impera, os repórteres se acalmam e o diretor-presidente da maior empresa de tecnologia armamentista do mundo fala:
— Senhoras e senhores, bom dia! Em virtude da enorme procura de vocês pela minha pessoa, marquei esta coletiva de imprensa. Peço apenas para que vocês respeitem o número de ordem que receberam na entrada e apresentem-se a medida que forem fazendo suas perguntas. Obrigado! Podem começar.
— Bom dia, senhor Marx, Washington da Silva, do Diário de Natal...
As perguntas e suposições sobre a AmbiGen continuam, enquanto isso, Micarla recebe uma ligação:
— Corporação Marx, bom dia! O senhor...
— Micarla, sou eu Mimic – interrompe-a velozmente – estamos aqui na AmbiGen.
— Algum problema, Luciano?
— Precisamos de acesso a rede Marxnet. Onde há um próximo daqui.
— Só um instante... peraí... rastreio completo, Mimic. Instituto Reis Magos. Não se preocupe com a direção, estou mandando um aviso de que vocês irão lá neste momento, a senha de acesso temporário eu enviarei assim que vocês se conectarem e me alertarem.
Após chegar ao Reis Magos e contatar Micarla, Mimic acessa a Marxnet e o satélite M-07, gerando uma visão mais detalhada da área. Em instantes, os dados são transferidos para o laptop de Mimic que volta rapidamente para o local do acidente.
Utilizando a tecnologia a disposição, o herói mimético abre uma interface que faz com que ambos possam ver a área da explosão. Gnomo avisa que as explosões têm um ritmo único, são cerca de seis explosões com intervalos de 26 segundos entre uma e outra e, depois, um tempo de exatamente 6 minutos e 14 segundos para reinício de uma nova seqüência. É necessário, mesmo assim, aguardar de dois a três minutos para que as chamas baixem e a temperatura diminua o que acaba restando cerca de pouco mais que três minutos para uma análise geral da situação.
Enquanto Mimic repassa os dados para seu laptop e instala uma câmera na fronte de Gnomo, este se concentra observando cautelosamente onde irá pôr os pés. Quando o termostato do satélite indica 45º graus, ele parte. Restam-lhe exatamente 3 minutos e 11 segundos, mas é necessário descobrir a fonte das explosões.
Correr por áreas conhecidas é fácil, pois já se tem idéia dos obstáculos a serem encontrados, o problema é que esta área, além de desconhecida, não pode ser realmente analisada visualmente, resta a Gnomo contar com a sorte. Enquanto corre pelas áreas devastadas pelas intensas explosões, vai procurando movimentar-se de forma que a microcâmera instalada em sua fronte possa captar o máximo possível de coisas pelo caminho e enviando-as ao laptop de Mimic.
─ Gnomo, 15 segundos... Volte!
─ Espere! Ainda há uma área logo a frente...
─ Não vá, amigo! É perigoso. O computador indica aumento de temperatura.
─ Quanto tempo tenho?
─ 9 segundos, oito...
─ Fui... A sorte está comigo hoje.
─ Sete
Velozes passos se movem pelo corredor
─ Seis... Volte Gnomo!
A voz de Mimic ecoa no microfone em seu ouvido, enquanto isso, Gnomo vai procurando absorver o máximo de informação possível.
─ Cinco, não vai haver tempo para você voltar... quatro...
─ Sem neuras, estou com sorte ho... BUUUUM!
Não se sabe ao certo o que causou a explosão antes do término do tempo, mas Mimic viu seu amigo ser arremessado contra uma parede e cair. Morto? Se não estiver, não viverá muito. Olhos desesperados acompanham a contagem final ... três... dois...
─ Porra! Não tenho como ajudar.
De repente, dos céus, uma sombra recobre o local onde Mimic está, alguém se lança pesadamente ao chão enquanto abre seus próprios braços. O uniforme revela a origem: Distrito Mutante, Academia CENTRAL, a última visão de Mimic antes da explosão: um garoto do DM de braços abertos.
Largando seu laptop e rapidamente tentando levantar-se, Mimic grita:
─ Meu Deus!!! Um menino!
Mãos fortes seguram seus ombros e uma voz conhecida diz:
─ Tenha calma. É ajuda!
─ Comando?
─ Espere e verá.
─ Mas Gnomo está lá
─ Eu sei!
As explosões seguem, contínuas, são quase três minutos que parecem uma eternidade. Os olhos apreensivos de Mimic vêem mais duas pessoas com Comando e Anjo Caído. A primeira pessoa, um garoto franzino, tão magro que parece não agüentar o peso do próprio corpo. A segunda, uma jovem, percebe-se pelas formas do corpo, cabelos negros, encaracolados, usa um capacete que esconde boa parte de seu rosto e que permite ver apenas o que está abaixo de seus olhos.
Quando a última explosão cessa, ouve-se a potente voz de Comando:
─ Preparem-se!!! Mimic monitore tudo.
Um aceno de cabeça positivo e tudo pronto para ser monitorado. Aos olhos surpresos de Luciano, o franzino garoto se afasta e, de braços abertos e rosto para o alto, solta um urro. Uma estranha metamorfose acontece, os ossos do garoto parecem brotar de sua pele e começam a revestir seu corpo como uma armadura, uma fina membrana cartilaginosa recobre sua boca, seus olhos, a entrada de suas narinas e ouvidos e também as suas articulações. O resto do seu corpo é recoberto por um exoesqueleto protetor.
─ Parabéns, Exo! – felicita-se Comando - Seu controle está cada vez melhor.
─ Obrigado, Senhor, mas ainda dói bastante.
─ Nada que você não consiga controlar com o tempo e treinamento corretos. Agora venha e use sua força bruta para elevar aquele maquinário e lançá-lo abaixo, para que tenhamos uma improvisada escada.
─ Certo.
─ Vídeo-Tape, ajude Mimic no monitoramento das explosões.
─ Sim, senhor.
A suave e infante voz revela para Mimic que a jovem, embaixo do capacete, não passa de uma menina.
─ Que tipo de interface o Senhor está utilizando? – indaga Vídeo-Tape enquanto olha para Mimic.
─ Visual, para que possamos ver e procurar o epicentro das explosões.
A poderosa voz de comando interrompe as explicações.
─ Agora, pessoal!
O jovem Exo levanta com facilidade um resto de maquinário que seriam preciso cerca de dez homens para erguê-lo e o arremessa como um garoto joga uma bolinha de papel no ponto indicado por Comando gerando, assim, um apoio para a descida e provável subida.
As chamas baixam e, mais ao canto, surge uma redoma de partículas elétricas que protege o garoto que pulou no fogo e o desacordado Gnomo.
─ Anjo Caído, traga Gnomo. Vídeo-Tape, monitore o tempo das explosões e Exo, venha, nos entraremos lá em três... dois... agora.
Junto com Exo, Comando salta na estrutura que outrora fora o laboratório de pesquisas ambientais da AmbiGen. Anjo Caído passa sobre suas cabeças num vôo rápido e rasante, tão rápido quanto seu vôo é sua pressa em pegar o corpo de seu companheiro Gnomo, um alívio toma conta do coração de Carlos Alberto, quando ele percebe que seu pequenino amigo ainda respira. Volta veloz. Enquanto isso, os dois heróis chegam e juntam-se ao outro garoto para, juntos, vasculharem a área.
─ 3 minutos, Comando. Está me escutando?
─ Alto e claro, Mimic. Mantenha-nos informado – virando-se para o outro garoto, continua: ─ Dá pra agüentar, Termocarga?
─ Claro, senhor! O problema foi só o calor, mas o tecnotecido de nossas vestes funciona bem, eu só não sei exatamente como está o carinha que estava desmaiado. Havia muito sangue.
Uma sombra passa rapidamente
— Não se preocupe, garoto. Ele está ferido, mas está bem! – ressoou no ar a voz gutural de anjo Caído enquanto pousava.
— Comando?
— Sim, Mimic.
— Acabamos de perder a conexão com Sat M-07, no momento, vocês estão por conta própria. Lembrando: restam 2 minutos e 30 segundos.
— Pena. Anjo Caído, sobrevoe a área e indique-nos o epicentro das chamas. Vídeo-Tape, onde as explosões começaram?
— Só um instante, senhor.
— Seja rápida, não temos todo o tempo do mundo.
Mimic novamente se vê impressionado ao ver a menina caminhar até a borda e apontar a sua mão para a área do laboratório e, como num passe de mágica, as imagens se refazem em resíduos hectoplásmicos, mostrando o que aconteceu de alguns momentos antes da explosão que atingiu Gnomo até o momento em que Termocarga saltou e criou sua redoma de partículas elétricas.
— Senhor?
— Sim, Vídeo-Tape.
— As explosões começaram a cerca de 15 metros a esquerda de vocês. É algo... eca!!! ... borbulhante no chão. Há muito entulho ao redor.
Após a informação, Comando indica a localização para Anjo Caído que circunda a área e encontra o local. Descendo rapidamente ele até tenta se aproximar do local, mas um imenso aumento de temperatura não o permite chegar. Não há quase nada em chamas, no momento, mas, próximo do local há uma onda de calor quase insuportável.
— Não consigo me aproximar mais, Comando. Está muito quente.
— Quente? Mimic, monitore a temperatura local.
— Já estou fazendo isso, mas a maior indicação de temperatura indicada é de 47º graus.
— Estranho... Exo, abra caminho.
— Para onde, senhor.
— Esquerda, 60 graus.
— Termocarga, passaremos abaixo daquela estrutura que está prestes a cair, não quero que ela caia sobre nós...
— Já entendi, senhor.
Enquanto Exo usa de sua poderosa armadura óssea e vai abrindo caminho por entre os destroços do laboratório, Termocarga dispara sua rajada elétrica concentrada contra uma redoma semidestruída. Atingida em cheio e com carga total a redoma se estilhaça e, pra surpresa geral, revela um intacto elevador transparente.
— 60 segundos, Comando!
— Ok, Mimic! Já estamos quase na área
— Senhor, o que procuramos? – indaga Exo.
— Uma coisa borbulhante no chão.
— Seria aquilo? – aponta termocarga em direção a uma espécie de geléia porosa, rosada e borbulhante.
— Creio que sim.
Ao chegarem próximos ao composto, sentem uma enorme elevação na temperatura, imediatamente, como que antecipando o pior, Termocarga gera uma redoma protetora sobre o composto. Alguns segundos depois, as explosões reiniciam, só que são contidas pela barreira de partículas elétricas.
— Comando, como vamos conter isso? – pergunta Termocarga.
— Você pode agüentar quanto tempo?
— Não sei, senhor.
— Aguarde um pouco, vou pedir ajuda. Enquanto isso, Exo, Vídeo-Tape e Mimic procurem pistas e corpos.
Quase uma hora depois
— Comando, eu... não... vou agüen...tar... mais... Muita ... mui... ta... e... ener... gia... acumu...la...da.
— Só mais um pouco, garoto! Eu sei que você consegue.
O tempo agora é inimigo... passa lentamente, as explosões continuam.
Depois de uma varredura biológica, Mimic avisa que os únicos seres vivos naquele local são eles próprios. Anjo Caído reaparece trazendo Distal, junto com ele também vem a tenente Thuanny Araújo que traz um container retangular.
Termocarga já está a quase três horas absorvendo energia térmica, o suor escorre pelo rosto do garoto, um frio sem explicação percorre a sua espinha, outra seqüência de explosões começa. O jovem herói ajoelha-se. Está exausto. Mas mantém a firmeza de sua barreira protetora. O container é aberto, a tenente Thuanny se aproxima na sua CyberMarx e fala:
— Quando eu mandar, baixe sua barreira e eu colocarei o composto aqui.
— S... s... sim, ... ... te... nen... te!
Respirando ofegantemente, o jovem Jefferson Luís obedece as ordens da tenente Thuanny. Com a barreira baixa, a tenente, utilizando um braço acoplado a CyberMarx suga o composto e deposita-o no container que é imediatamente fechado e lacrado.
Um grito...
Outro... Ecoam no ar e reverberam pelas paredes do laboratório, heróis se preparam para o pior, mas não há inimigos. Em meio ao som impactante, um jovem de apenas 16 anos eleva suas mãos aos céus, seu corpo libera um brilho intenso e descargas elétricas percorrem-no por completo. No último instante do ecoar de um grito de dor intensa, uma poderosa e gigantesca rajada elétrica é disparada em direção ao infinito azul. Comando e a tenente Thuanny oram para que não haja nenhum avião passando por ali naquele momento. Em seu último pensamento consciente, Jefferson Luís, conhecido pelo codinome de Termocarga, também pede a Deus para que não haja vítimas de seu descontrole... e cai inconsciente. Preocupado com o garoto, Comando corre em sua direção. Vídeo-Tape e Exo tentam segurá-lo, em vão, não conseguem. Quando o líder deste estranho grupo se aproxima do corpo inconsciente do mutante, ainda consegue escutar um último apelo da tenente Thuanny gritando para que não o toque. Tarde demais... Uma descarga de 10.000 volts atinge Comando e o arremessa a cerca de 6 metros, fazendo cair também inconsciente.
Verdades Reveladas
A Corporação Marx é, hoje, uma das maiores empresas particulares do planeta. Somando suas atividades em robótica, eletrônica e produção armamentista a CoMarx fatura cerca de 100 milhões de dólares mensalmente.
Entretanto, tal faturamento não é utilizado apenas para engordar os bolsos de Paulo Henrique Marx e seus associados. Boa parte deste dinheiro é destinado a casas de apoio a drogados, manicômios – principalmente o de Macaíba –, reflorestamentos, assistência a crianças abandonadas e, em parceria com a UFRN, pesquisas para a melhoria do meio-ambiente.
Nesse ramo, a CoMarx mantém três subsidiária: a AfrincanLIVE, em Ruanda, no continente africano; a Biosphere Modify, na Europa Central e a AmbiGen, na América do Sul, Brasil, mais precisamente em Natal, capital do estado mais desenvolvido do país, o Rio Grande do Norte.
E é justamente na AmbiGen que nossa história começa.
Entrar na empresa é a certeza de deparar-se com 180 funcionários jovens em processo de estágio gerado pela parceria CoMarx/UFRN, todos trabalhando com as mais diversificadas e variadas espécies de plantas, procurando dar o melhor de si para que o planeta sobreviva ao que o homem , no geral, vem lhe fazendo. Um grupo de 20 cientistas de genética ambiental é quem serve de professores e orientadores para os estagiários. É comum acontecer de alguns estagiários depois virem a se tornar contratados da CoMarx como biólogos, geneticistas, oceanógrafos e tantas quantas forem as possibilidades científicas a serem exploradas.
No entanto, quem “manda” na AmbiGen é o biogeneticista e físico nuclear Rafael Belmont. Formando o conclave do círculo interno, mas abaixo de Belmont, encontramos Erick Miller – PhD em Eletrogenética; Janete Van-Hugges – PhD em Biologia Marinha e Ecossistemas; as gêmeas Illia e Marya Kurkova – Especialistas em Robótica e Informatização; e, por fim, Marcos Aguiar – PhD em Engenharia Genética.
Apesar da notável variação lingüística e étnica existente, afinal, Belmont é francês, Erick e Marcos são brasileiros, Hugges é holandesa e as irmãs kurkova são russas, a comunicação entre eles é absolutamente perfeita.
Porém, a verdade por trás da AmbiGen está longe de ser aquela que está a vista. Distante dos olhos de todos e servindo de jarro para uma samambaia geneticamente modificada colocada em uma estufa de vidro, onde só entram o doutor Belmont e o conclave interno, encontra-se um simplório interruptor que revela o que realmente é o laboratório de pesquisas ambientais no Brasil. Ao simples estalar do “click” do interruptor, portas metálicas milimetricamente camufladas na estufa de vidro se abrem revelando um enorme e muito bem projetado laboratório subterrâneo. Um elevador equipado com a mais alta tecnologia já produzida pela CoMarx é o convite de entrada para o mundo por trás da AmbiGen. Totalmente feito em acrílico, com painel de controle virtual e um mecanismo completa e absolutamente silencioso, o veículo locomotor é a única forma de descer e subir os três andares subterrâneos.
Ah, caros leitores, vocês acham que os andares subterrâneos são a continuação do laboratório de pesquisas biológicas e ambientais? Ledo engano. O complexo é utilizado para a pior forma de atrocidade que possa existir: pesquisas e genemodificações em cobaias humanas. Perto do que é feito nos secretos subterrâneos do laboratório da AmbiGen, o holocausto nazista é brincadeira de criança.
No 1º andar, uma área circular de cerca de 40 metros de raio, há um grupo de homens armados até os dentes, separados a perfeita distância de 3 metros cada, com ordem de matar qualquer um sem autorização ou que ultrapasse a chamada “Linha Verde”, um espaço que pré-determina quem vive e quem está passível de morrer. Uma espécie de arena baixa toma parte da área central, paredes de molibdênio circundam-na, um teto transparente formado a partir de um polímero extremamente flexível e resistente retirado da casca do ananás silvestre – o famoso abacaxi – recobre-a. O local está vazio, no entanto, a atmosfera e a ambientação podem ser imediatamente geradas a partir de imagens holográficas polidimensionais. É o campo de testes de Belmont e seu conclave interno. Na visão oposta, encontra-se a sala de monitoramento, de lá são acompanhados e analisados os testes nas cobaias.
No segundo andar do laboratório, encontram-se as salas de operações, os tanques de transfusão e o computador central da AmbiGen. Mas é no terceiro andar que o horror realmente começa. Aqui se encontra o calabouço onde ficam acomodadas as cobaias para as experiências genéticas. Horrores inimagináveis são cometidos aqui.
Agora, imaginemos que um sujeito que possui o próprio grupo de superseres e se autodenomina herói deve, na verdade, ser o maior hipócrita e crápula mentiroso que existe... é! Deveria ser, mas não é!!! Na verdade, tudo que ocorre nos subterrâneos da AmbiGen é mantido num sigilo tão absoluto que nem o próprio presidente da Corporação Marx, Paulo Henrique Marx, sabe que o laboratório de pesquisas ambientais no Brasil é utilizado para fazer experiências de alterações genéticas e eletrônicas em seres humanos.
CAPÍTULO 1 – Incidente
19h
Laboratório de Pesquisas da AmbiGen, Natal, Brasil.
A noite está tranqüila, o céu claro e límpido, dá até para contar as estrelas. José Maria de Souza, o vigia do laboratório, lacra a última porta, olha pacientemente o seu relógio, são 19:02h, suspira... vai ser mais uma monótona noite . “Melhor assim!”, pensa ele, lembrando do último vigia a trabalhar na AmbiGen que fora afastado sem justa causa. Mudou-se. Dizem que está morando em Picos, no Piauí. Longe. Muito longe.
“Melhor assim! ... ... É... ... ... Melhor assim” – Pondera Zé Maria enquanto caminha suavemente entre as plantas do laboratório, assoviando uma canção de Roberto Carlos e lembrando que o seu colega de profissão começou a insistir que estava escutando estranhos barulhos durante a noite. Deram-lhe as contas e depois se mudou.
“Estranho! Mateus adorava Natal. Então por que ir embora tão repentinamente?... Sei lá!? Eu acho melhor parar de pensar nessas bobagens”. Absorto em seus pensamentos, Zé Maria continua o seu trabalho.
Há três meses apenas ele estava desempregado. A mulher o abandonara a quase um ano por causa da bebida, também por causa da bebida perdera o último emprego, os filhos não faziam questão de vê-lo. Rejeitado e abandonado, só restava a Zé Maria o consolo da morte e era exatamente o que ele estava se preparando para fazer: colocou o cano longo do revólver calibre 38 em sua própria boca. De repente, prestes a atirar, palmas... era na sua porta... mais palmas, não ligou, era um cobrador, logo iria embora, mas ele não devia a ninguém... mais palmas... parou e pensou um pouco... a pessoa que batia palmas defronte a sua casa insistia... resolve então atender. Era o seu vizinho, um doutor. Não se lembra do quê, mas sabe que ele era um doutor. Nunca foram próximos. Conversaram? Nunca. No máximo trocaram “bons dias” soltos em encontros casuais. Agora estava ele ali, parado a sua frente com um envelope na mão direita e um sorriso repleto de vida que incomodava Zé Maria.
─ Bom dia, vizinho. Me disseram que você já trabalhou de vigia...
─ É verdade! – responde seu Zé ríspido e seco entrecortando a fala do momentaneamente indesejado visitante e continua – mas estou desempregado agora.
E vai vagarosamente fechando a porta. O vizinho segura-a colocando seu pé entre a caixa e a porta:
─ Tenho uma oferta de trabalho para o senhor.
─ Para mim?
─ Sim! O senhor não é... – olha no envelope.
─ José Maria de Souza.
─ Isso mesmo, tome seu José.
─ Pode chamar de Zé Maria como todo mundo. – retruca enquanto olha o envelope.
O olhar do desempregado perde-se ao ver a logomarca do laboratório em que tanto sonhara trabalhar, a felicidade torna-se maior ainda quando, junto ao símbolo do laboratório da AmbiGen, paira o símbolo da CoMarx.
Parou de beber, os filhos ainda não o procuram, nem a mulher. Mas isso não importa, pois existe respeito no trabalho, com os amigos, com os patrões. O respeito da família? É só uma questão de tempo.
Sua mente volta ao presente, um leve sorriso banha sua face ríspida a austera. Um leve sorriso que, aos poucos, vai desaparecendo diante de uma luz vermelha que pisca incessantemente. Em seu último ato, o vigia leva a mão ao coldre e... ... ... Desaparece num piscar de olhos.
Uma luminescência azulada banha todo o laboratório térreo da AmbiGen e, quando a estranha luz se desfaz, não há vestígios de nada vivo no que antes era o maior reservatório de plantas, a mais diversificada biosfera laboratorial da América Latina.
Vazio...
Lúgubre e silencioso vazio, desfeito apenas pelo singelo ruído do tic-tac de um relógio que paira sobre a porta de entrada do laboratório.
São 19:25h.
● ● ●
07:10h
Residência de Marília Graziele, Alecrim, Natal
Um despertador toca pela quinta vez... os olhos cansados se abrem.
— Puta que pariu!!! Eu tô atrasada!!! Se “seu” Zé não me matar, o doutor Belmont me despede... Puta que pariu!!!
— Calma, gata
— Não da pra ter calma
— Seu horário não é só as 8. Pô, tem calma.
— Calma o cacete, Daniel eu tenho que abrir o laboratório antes da chegada de todo mundo.
— Pô, Marília, ainda são 7:12h. Dá um tempo.
— Eu tinha que ta lá às 7h.
Essa vai ser a terceira vez que Marília Grazielle chega atrasada. Na primeira vez apenas olhares severos. Na segunda uma advertência:
— Se a senhorita chegar atrasada mais uma vez será despedida.
— Desculpe, Dr. Belmont. E que...
— Em nosso meio de trabalho, mocinha, não a espaço para desculpas ou erros. Passar bem!
Num cochicho quase inaudível, enquanto o Dr. Belmont se retira, Marília fala para Zé Maria, o homem que nos últimos dois meses tem sido o pai que ela nunca teve:
— Que homem grosso e estúpido!
— Mas ele tem razão, menina Marília, nesse ramo, o erro é fatal e a desculpa, inaceitável.
Inaceitável. A palavra reverbera na mente de Marília enquanto ela cata suas coisas e rapidamente se veste.
7:18h. Correndo, Marília sai de casa e agradece o fato de sua casa ser no mesmo bairro que o laboratório.
7:23h. Marília entra na rua da AmbiGen. “Que estranho...” pensa ela “Seu Zé deveria estar do lado de fora, me esperando... o que aconteceu?”
7:24h. A porta principal esta trancada, ninguém responde. Bate forte, nada acontece. Clama por “seu” Zé Maria. Nada.
Em seu último ato, Marília encosta o ouvido junto a porta, a fim de tentar ouvir algo... Um leve sibilo ssssss...
Booooooom!
São 7:25h.
Capítulo 2 – Investigação
Um interfone impaciente acorda um homem muito cansado.
— Sr. Marx! Sr.Marx! Acorde, por favor.
— O que foi, Micarla? - Pega o relógio, na cabeceira, são 8 horas – deve ser urgente pra você me acordar essa hora.
— Senhor Marx, ligue a TV já.
— Por quê ?
— Ligue e o senhor verá.
— Tá! Tá! Não precisa gritar! Eu tô ligando. Mãos adormecidas caçam o controle remoto da TV enquanto os pensamentos de Paulo Henrique Marx se preenchem de dúvidas.
O click da TV em resposta do sinal do controle pega o diretor-presidente da corporação Marx de calças curtas
— Estamos aqui, ao vivo, do local onde antes havia o renomado laboratório de pesquisas ambientais conhecido como Ambigen. Os bombeiros tentam apagar o incêndio que já dura quase 40 minutos. Constantes explosões impedem que os guerreiros do jogo consigam se aproximar do local onde o foco de incêndio parece maior, o segundo andar subterrâneo da AmbiGen. Até o momento não foram encontrados vestígios de seres vivos na área do laboratório. Confirmada mesmo, apenas uma vítima fatal: A bióloga Marília Grazielle, de 23 anos. Fora encontrada do lado de fora do laboratório com queimaduras em 70% do corpo, faleceu antes que os paramédicos pudessem ajudá-la.
— Srta Micarla?
— Sim, senhor Marx!
— Chame Comando, Mimic, Gnomo e Anjo caído.
— Mas senhor, chamar sua elite de guarda-costas e a suprema força? Por quê ?
— Quando eles chegarem, você saberá. Chame-os aqui, imediatamente.
— Claro, senhor Marx.
Enquanto veste seu uniforme e escolhe um terno para a bomba que está prestes a explodir, Paulo pensa e categoriza as melhores respostas para serem dadas a imprensa. Com uniforme vestido e o terno na mão, ele apanha novamente o controle
“Click”
—... Os bombeiros ainda não sabem as causas das constantes explosões, mas supõem que seja um vazamento de gás, visto que um sibilo como o de vazamento do gás sempre antecede as explosões.
— Senhor Marx
— Sim Micarla
— Coloque no canal 17, senhor.
— 17 ?
— Sim.
“Click”
— ... A morte da bióloga Marília Grazielle, vítima da explosão do prédio da Ambigen. No entanto, não é esse apenas o primeiro fato estranho, alguns moradores da redondeza dizem que, durante a noite, uma estranha luz azul partiu do prédio uma enorme redoma azulada e, simplesmente, desapareceu, alguns segundos depois.
Não é a primeira vez que estranhos boatos circundam a Ambigen, a cerca de quatro meses um de seus funcionários, o vigia noturno, Emanoel Góes, desapareceu repentinamente após ter dito que escutava estranhos barulhos vindo da parte de baixo do laboratório.
“click”
— Srta Micarla?
— Sim senhor! Ah, senhor, Luciano, Renato e Carlos Eduardo já chegaram.
— Ótimo. Mande-os subir. E marque uma coletiva com a imprensa para as dez horas.
— Mas, senhor Paulo, e a reunião com o senhor Gates?
— Pode esperar. O assunto aqui é mais urgente.
— Tudo bem, senhor... comando acaba de chegar. Estou mandando-o subir.
— Ok.
Enquanto aguarda seus comandos, Paulo procura pelos papéis que selaram a parceria com a Ambigen e as fotos dos arquivos. Agora ele tem absoluta certeza de que há algo de errado, de estranho e familiar com aquele doutor que o procurou no período em que a Corporação Marx procurava parceiros pelo mundo afora.
“Encontrei...” em seus pensamentos, uma alegria inconstante. “Aqui estão. Agora vejamos: É preciso primeiro cruzar os dados e as depois as fotos para descobrir onde já vi aquele doutor, como era mesmo o nome dele? Ah, Belmont... Rafael Belmont.”
Enquanto coloca os arquivos no Marxnet e cruza com os dados do computador central do distrito mutante, Paulo Henrique Marx, o mutante BALÃO, recebe sua guarda de elite e o líder de campo da suprema força.
· · ·
— Bem, pessoal, aqui estão alguns dados e algumas informações sobre o que esta acontecendo.
Como vocês sabem, por volta das 7:25h da manhã de hoje, o prédio da AmbiGen, no Alecrim, foi pelos ares. Explosão criminosa? Não sei e, no momento, isso não vem ao caso. O que realmente importa é saber o que estava acontecendo na AmbiGen.
— Não entendi, senhor Marx.
— É simples, Comando. Até às 7:59h de hoje eu achava que a AmbiGen só mexia com plantas e só tinha o prédio básico. No entanto, a explosão revelou um complexo subterrâneo de cerca de três andares e, além disso, a explosão também revelou altíssima tecnologia. Parte disso já destruída , mas muito a vista como se pode perceber por estas imagens que vocês têm nessas pastas. Resumindo: não era só com meio-ambiente que a AmbiGen tratava.
Quero que vocês juntem forças, visto que grande parte da Suprema Força está de férias, e investiguem o que está havendo. Por enquanto, eu ficarei aqui. Logo, os urubus da imprensa ligarão a AmbiGen com a CoMarx e será preciso eliminar alguns inimigos televisivos.
Comando, conto com sua astúcia. Se precisar de algo, contate a tenente Thuanny Araújo.
— Sim, senhor! Vamos, rapazes.
A caminho, Comando explica o seu plano e parte, junto com Anjo Caído – codinome de Carlos Eduardo – para a academia central do Distrito Mutante; enquanto Ozenir Luciano, o Mimic, e Renato, o Gnomo, partem para o prédio da AmbiGen.
· · ·
9h
Academia CENTRAL do Distrito Mutante
Por trás da fachada de Academia Militar, existe um complexo que treina e ensina mutantes jovens a controlarem os seus dons. O nome CENTRAL significa CENtro de TReinamento ALfa.
No caminho, Comando contatou a tenente Thuanny e indicou-lhe três nomes de cadetes para que ajudassem na situação da AmbiGen.
Enquanto isso, na CoMarx, Paulo recebe uma ligação de uma preocupada tenente:
— Bom dia, Senhor Paulo!
— Bom dia, Tenente Thuanny.
— Senhor, minha ligação refere-se a um pedido de um de seus homens, o Comando.
— Sim...
— Ele pediu a liberação de três recrutas da CENTRAL e, perdoe-me a franqueza, mas eles não estão preparados para ações de campo.
— Tenha calma, tenente. Eu confio na decisão de Comando, se ele escolheu os tais três recrutas, é porque sabe que suas aptidões mutantes serão úteis.
— Mas, senhor, o mais velho deles tem apenas 18 anos.
— Tenente, nós não fomos ensinados a usar nossos poderes ou dons, aprendemos por conta própria. A vida nos foi professora e, como você sabe muito bem, começamos tão ou mais cedo do que eles. Esses garotos da CENTRAL têm uma enorme vantagem: controle, ensinamento e proteção. Confie em Comando e, além do mais, é só um mísero incêndio.
A suave, porém moderada, voz utilizada pelo Diretor-Presidente da Corporação Marx preencheu o coração preocupado da tenente Thuanny... um silêncio impera ao telefone até que é quebrado pela mesma terna e compreensiva voz de antes:
— Tenente?
— Tudo bem, senhor Paulo, o senhor me convenceu. Espero que nada de mal ocorra aos meus cadetes.
— Não se preocupe. Tem a minha palavra de que nada de mal acontecerá a eles.
— Obrigado, senhor!
· · ·
Longe dos olhos de Paulo, Comando e da tenente Thuanny uma explosão acontece acompanhada de uma estranha e bela descarga azulada que faz com que , diante das câmeras, dezesseis bombeiros desapareceram, assim como a famosa repórter Lidiane.
Mimic e Gnomo estavam acabando de chegar ao local e presenciaram o estranho fenômeno. Imediatamente, começaram a afastar as pessoas do local.
Após afastarem as pessoas para uma distância considerada segura, Gnomo passa a procurar pistas enquanto Mimic monitora as explosões.
Apesar do cuidado excessivo, uma coisa não foge à mente dos dois heróis: a estranha explosão azulada que eles presenciaram ao chegar e o sumiço dos bombeiros e da repórter. O que será que foi aquilo?
· · ·
10:03h
Edifício Vinícius Marx
Auditório Central da CoMarx
— Os repórteres?
— Estão aguardando e... senhor Paulo... eles estão muito agitados com tudo isso!
— Obrigado, Micarla! Bom saber que posso confiar em alguém... Bom!!! – Suspira e ajeita a gravata – Seja o que Deus quiser!
Paulo Henrique Marx caminha de forma consciente e segura em direção aos odiosos abutres da imprensa, suspira novamente, ajeita a gravata mais uma vez, e, quando abre a porta, é literalmente engolido por uma avalanche de repórteres que se empurram e se debatem tentando fazer seus microfones chegarem próximos do homem mais importante do Brasil, talvez do mundo.
Caminhando silenciosamente entre o turbilhão de repórteres, Paulo coloca-se na tribuna e testa muito pacientemente os microfones. O silêncio impera, os repórteres se acalmam e o diretor-presidente da maior empresa de tecnologia armamentista do mundo fala:
— Senhoras e senhores, bom dia! Em virtude da enorme procura de vocês pela minha pessoa, marquei esta coletiva de imprensa. Peço apenas para que vocês respeitem o número de ordem que receberam na entrada e apresentem-se a medida que forem fazendo suas perguntas. Obrigado! Podem começar.
— Bom dia, senhor Marx, Washington da Silva, do Diário de Natal...
As perguntas e suposições sobre a AmbiGen continuam, enquanto isso, Micarla recebe uma ligação:
— Corporação Marx, bom dia! O senhor...
— Micarla, sou eu Mimic – interrompe-a velozmente – estamos aqui na AmbiGen.
— Algum problema, Luciano?
— Precisamos de acesso a rede Marxnet. Onde há um próximo daqui.
— Só um instante... peraí... rastreio completo, Mimic. Instituto Reis Magos. Não se preocupe com a direção, estou mandando um aviso de que vocês irão lá neste momento, a senha de acesso temporário eu enviarei assim que vocês se conectarem e me alertarem.
Após chegar ao Reis Magos e contatar Micarla, Mimic acessa a Marxnet e o satélite M-07, gerando uma visão mais detalhada da área. Em instantes, os dados são transferidos para o laptop de Mimic que volta rapidamente para o local do acidente.
Utilizando a tecnologia a disposição, o herói mimético abre uma interface que faz com que ambos possam ver a área da explosão. Gnomo avisa que as explosões têm um ritmo único, são cerca de seis explosões com intervalos de 26 segundos entre uma e outra e, depois, um tempo de exatamente 6 minutos e 14 segundos para reinício de uma nova seqüência. É necessário, mesmo assim, aguardar de dois a três minutos para que as chamas baixem e a temperatura diminua o que acaba restando cerca de pouco mais que três minutos para uma análise geral da situação.
Enquanto Mimic repassa os dados para seu laptop e instala uma câmera na fronte de Gnomo, este se concentra observando cautelosamente onde irá pôr os pés. Quando o termostato do satélite indica 45º graus, ele parte. Restam-lhe exatamente 3 minutos e 11 segundos, mas é necessário descobrir a fonte das explosões.
Correr por áreas conhecidas é fácil, pois já se tem idéia dos obstáculos a serem encontrados, o problema é que esta área, além de desconhecida, não pode ser realmente analisada visualmente, resta a Gnomo contar com a sorte. Enquanto corre pelas áreas devastadas pelas intensas explosões, vai procurando movimentar-se de forma que a microcâmera instalada em sua fronte possa captar o máximo possível de coisas pelo caminho e enviando-as ao laptop de Mimic.
─ Gnomo, 15 segundos... Volte!
─ Espere! Ainda há uma área logo a frente...
─ Não vá, amigo! É perigoso. O computador indica aumento de temperatura.
─ Quanto tempo tenho?
─ 9 segundos, oito...
─ Fui... A sorte está comigo hoje.
─ Sete
Velozes passos se movem pelo corredor
─ Seis... Volte Gnomo!
A voz de Mimic ecoa no microfone em seu ouvido, enquanto isso, Gnomo vai procurando absorver o máximo de informação possível.
─ Cinco, não vai haver tempo para você voltar... quatro...
─ Sem neuras, estou com sorte ho... BUUUUM!
Não se sabe ao certo o que causou a explosão antes do término do tempo, mas Mimic viu seu amigo ser arremessado contra uma parede e cair. Morto? Se não estiver, não viverá muito. Olhos desesperados acompanham a contagem final ... três... dois...
─ Porra! Não tenho como ajudar.
De repente, dos céus, uma sombra recobre o local onde Mimic está, alguém se lança pesadamente ao chão enquanto abre seus próprios braços. O uniforme revela a origem: Distrito Mutante, Academia CENTRAL, a última visão de Mimic antes da explosão: um garoto do DM de braços abertos.
Largando seu laptop e rapidamente tentando levantar-se, Mimic grita:
─ Meu Deus!!! Um menino!
Mãos fortes seguram seus ombros e uma voz conhecida diz:
─ Tenha calma. É ajuda!
─ Comando?
─ Espere e verá.
─ Mas Gnomo está lá
─ Eu sei!
As explosões seguem, contínuas, são quase três minutos que parecem uma eternidade. Os olhos apreensivos de Mimic vêem mais duas pessoas com Comando e Anjo Caído. A primeira pessoa, um garoto franzino, tão magro que parece não agüentar o peso do próprio corpo. A segunda, uma jovem, percebe-se pelas formas do corpo, cabelos negros, encaracolados, usa um capacete que esconde boa parte de seu rosto e que permite ver apenas o que está abaixo de seus olhos.
Quando a última explosão cessa, ouve-se a potente voz de Comando:
─ Preparem-se!!! Mimic monitore tudo.
Um aceno de cabeça positivo e tudo pronto para ser monitorado. Aos olhos surpresos de Luciano, o franzino garoto se afasta e, de braços abertos e rosto para o alto, solta um urro. Uma estranha metamorfose acontece, os ossos do garoto parecem brotar de sua pele e começam a revestir seu corpo como uma armadura, uma fina membrana cartilaginosa recobre sua boca, seus olhos, a entrada de suas narinas e ouvidos e também as suas articulações. O resto do seu corpo é recoberto por um exoesqueleto protetor.
─ Parabéns, Exo! – felicita-se Comando - Seu controle está cada vez melhor.
─ Obrigado, Senhor, mas ainda dói bastante.
─ Nada que você não consiga controlar com o tempo e treinamento corretos. Agora venha e use sua força bruta para elevar aquele maquinário e lançá-lo abaixo, para que tenhamos uma improvisada escada.
─ Certo.
─ Vídeo-Tape, ajude Mimic no monitoramento das explosões.
─ Sim, senhor.
A suave e infante voz revela para Mimic que a jovem, embaixo do capacete, não passa de uma menina.
─ Que tipo de interface o Senhor está utilizando? – indaga Vídeo-Tape enquanto olha para Mimic.
─ Visual, para que possamos ver e procurar o epicentro das explosões.
A poderosa voz de comando interrompe as explicações.
─ Agora, pessoal!
O jovem Exo levanta com facilidade um resto de maquinário que seriam preciso cerca de dez homens para erguê-lo e o arremessa como um garoto joga uma bolinha de papel no ponto indicado por Comando gerando, assim, um apoio para a descida e provável subida.
As chamas baixam e, mais ao canto, surge uma redoma de partículas elétricas que protege o garoto que pulou no fogo e o desacordado Gnomo.
─ Anjo Caído, traga Gnomo. Vídeo-Tape, monitore o tempo das explosões e Exo, venha, nos entraremos lá em três... dois... agora.
Junto com Exo, Comando salta na estrutura que outrora fora o laboratório de pesquisas ambientais da AmbiGen. Anjo Caído passa sobre suas cabeças num vôo rápido e rasante, tão rápido quanto seu vôo é sua pressa em pegar o corpo de seu companheiro Gnomo, um alívio toma conta do coração de Carlos Alberto, quando ele percebe que seu pequenino amigo ainda respira. Volta veloz. Enquanto isso, os dois heróis chegam e juntam-se ao outro garoto para, juntos, vasculharem a área.
─ 3 minutos, Comando. Está me escutando?
─ Alto e claro, Mimic. Mantenha-nos informado – virando-se para o outro garoto, continua: ─ Dá pra agüentar, Termocarga?
─ Claro, senhor! O problema foi só o calor, mas o tecnotecido de nossas vestes funciona bem, eu só não sei exatamente como está o carinha que estava desmaiado. Havia muito sangue.
Uma sombra passa rapidamente
— Não se preocupe, garoto. Ele está ferido, mas está bem! – ressoou no ar a voz gutural de anjo Caído enquanto pousava.
— Comando?
— Sim, Mimic.
— Acabamos de perder a conexão com Sat M-07, no momento, vocês estão por conta própria. Lembrando: restam 2 minutos e 30 segundos.
— Pena. Anjo Caído, sobrevoe a área e indique-nos o epicentro das chamas. Vídeo-Tape, onde as explosões começaram?
— Só um instante, senhor.
— Seja rápida, não temos todo o tempo do mundo.
Mimic novamente se vê impressionado ao ver a menina caminhar até a borda e apontar a sua mão para a área do laboratório e, como num passe de mágica, as imagens se refazem em resíduos hectoplásmicos, mostrando o que aconteceu de alguns momentos antes da explosão que atingiu Gnomo até o momento em que Termocarga saltou e criou sua redoma de partículas elétricas.
— Senhor?
— Sim, Vídeo-Tape.
— As explosões começaram a cerca de 15 metros a esquerda de vocês. É algo... eca!!! ... borbulhante no chão. Há muito entulho ao redor.
Após a informação, Comando indica a localização para Anjo Caído que circunda a área e encontra o local. Descendo rapidamente ele até tenta se aproximar do local, mas um imenso aumento de temperatura não o permite chegar. Não há quase nada em chamas, no momento, mas, próximo do local há uma onda de calor quase insuportável.
— Não consigo me aproximar mais, Comando. Está muito quente.
— Quente? Mimic, monitore a temperatura local.
— Já estou fazendo isso, mas a maior indicação de temperatura indicada é de 47º graus.
— Estranho... Exo, abra caminho.
— Para onde, senhor.
— Esquerda, 60 graus.
— Termocarga, passaremos abaixo daquela estrutura que está prestes a cair, não quero que ela caia sobre nós...
— Já entendi, senhor.
Enquanto Exo usa de sua poderosa armadura óssea e vai abrindo caminho por entre os destroços do laboratório, Termocarga dispara sua rajada elétrica concentrada contra uma redoma semidestruída. Atingida em cheio e com carga total a redoma se estilhaça e, pra surpresa geral, revela um intacto elevador transparente.
— 60 segundos, Comando!
— Ok, Mimic! Já estamos quase na área
— Senhor, o que procuramos? – indaga Exo.
— Uma coisa borbulhante no chão.
— Seria aquilo? – aponta termocarga em direção a uma espécie de geléia porosa, rosada e borbulhante.
— Creio que sim.
Ao chegarem próximos ao composto, sentem uma enorme elevação na temperatura, imediatamente, como que antecipando o pior, Termocarga gera uma redoma protetora sobre o composto. Alguns segundos depois, as explosões reiniciam, só que são contidas pela barreira de partículas elétricas.
— Comando, como vamos conter isso? – pergunta Termocarga.
— Você pode agüentar quanto tempo?
— Não sei, senhor.
— Aguarde um pouco, vou pedir ajuda. Enquanto isso, Exo, Vídeo-Tape e Mimic procurem pistas e corpos.
Quase uma hora depois
— Comando, eu... não... vou agüen...tar... mais... Muita ... mui... ta... e... ener... gia... acumu...la...da.
— Só mais um pouco, garoto! Eu sei que você consegue.
O tempo agora é inimigo... passa lentamente, as explosões continuam.
Depois de uma varredura biológica, Mimic avisa que os únicos seres vivos naquele local são eles próprios. Anjo Caído reaparece trazendo Distal, junto com ele também vem a tenente Thuanny Araújo que traz um container retangular.
Termocarga já está a quase três horas absorvendo energia térmica, o suor escorre pelo rosto do garoto, um frio sem explicação percorre a sua espinha, outra seqüência de explosões começa. O jovem herói ajoelha-se. Está exausto. Mas mantém a firmeza de sua barreira protetora. O container é aberto, a tenente Thuanny se aproxima na sua CyberMarx e fala:
— Quando eu mandar, baixe sua barreira e eu colocarei o composto aqui.
— S... s... sim, ... ... te... nen... te!
Respirando ofegantemente, o jovem Jefferson Luís obedece as ordens da tenente Thuanny. Com a barreira baixa, a tenente, utilizando um braço acoplado a CyberMarx suga o composto e deposita-o no container que é imediatamente fechado e lacrado.
Um grito...
Outro... Ecoam no ar e reverberam pelas paredes do laboratório, heróis se preparam para o pior, mas não há inimigos. Em meio ao som impactante, um jovem de apenas 16 anos eleva suas mãos aos céus, seu corpo libera um brilho intenso e descargas elétricas percorrem-no por completo. No último instante do ecoar de um grito de dor intensa, uma poderosa e gigantesca rajada elétrica é disparada em direção ao infinito azul. Comando e a tenente Thuanny oram para que não haja nenhum avião passando por ali naquele momento. Em seu último pensamento consciente, Jefferson Luís, conhecido pelo codinome de Termocarga, também pede a Deus para que não haja vítimas de seu descontrole... e cai inconsciente. Preocupado com o garoto, Comando corre em sua direção. Vídeo-Tape e Exo tentam segurá-lo, em vão, não conseguem. Quando o líder deste estranho grupo se aproxima do corpo inconsciente do mutante, ainda consegue escutar um último apelo da tenente Thuanny gritando para que não o toque. Tarde demais... Uma descarga de 10.000 volts atinge Comando e o arremessa a cerca de 6 metros, fazendo cair também inconsciente.
CAPÍTULO 3 – Novidades
Corporação Marx
12h
Um cansado e bem sucedido empresário senta-se e suspira. Um suspiro aliviado? De forma alguma. Frustrante, essa seria a palavra para definir o suspiro de Paulo Henrique, diretor-presidente da Corporação Marx. Até o momento, quase nenhuma notícia sobre a AmbiGen.
— Senhor Paulo?
— Sim, Micarla.
— Err... Acabou de chegar uma encomenda para o senhor... quer dizer... não sei se é para o senhor, mas...
— Explique melhor: o que está acontecendo?
— Bem, há uma encomenda aqui, mas não tem remetente, só destinatário. Está escrito: “para meu amigo Paulo, corporação Marx”.
“Ah, mais essa agora!” – pensa Paulo enquanto se prepara para falar:
— Já fez análise espectográfica?
— Sim, senhor! É só um aparelho eletrônico, um tipo de gravador.
— Traga-o.
— Imediatamente, senhor Paulo.
Com a caixa em mãos, Paulo suspira uma outra vez e pensa: “Será mais uma decepção?” Mecanicamente, suas mãos abrem o invólucro de papelão enquanto seus pensamentos o levam de volta à coletiva de imprensa e a enxurrada de perguntas a que foi levado.
“George Nobre do Diário de Notícias, é verdade que a AmbiGen era um laboratório de armas químicas?”
“Antonielle Assunção do O Dia, como o senhor pode explicar o laboratório de altíssima tecnologia embaixo do complexo da AmbiGen?”
“Edson Amorim do Noticiário Padrão, da TV Ponta Negra. Que atrocidades eram cometidas nos subterrâneos da ambiGen? Eram criadas aberrações mutantes como seus guarda-costas?”
“Foi duro enfrentar todas aquelas perguntas, mas... o que é isso? Hummm... um minigravador? Sim... e há também um cd, na verdade, um mini-cd... espere... há algo escrito: para Paulo Henrique Câmara, de Erick Miller.
Meu Deus, a quanto tempo eu não escuto esse nome: Paulo Henrique Câmara, dá até vontade de rir... Bom, não é hora para certas lembranças... Erick Miller? Sim!!! Meu amigo da faculdade, mas faz quase dez anos que não nos vemos, desde que ele foi contratado pelo AmbiGen...”
A menção do nome da AmbiGen fez Paulo voltar ao presente e a situação atual. Com certeza, aquele cd contém informação essencial ao que estava acontecendo desde aquela fatídica manhã.
Cd no aparelho... Antes de ligar um aviso ao interfone:
— Micarla, não quero ser interrompido por hoje. Não estou para quem não sabe que eu estou e caso Comando ligue, você tem carta branca e responsabilidade.
— Sim, senhor Paulo.
Mãos outrora confiantes agora se aproximam do pequeno aparelho. Um toque suave inicia a transmissão.
CAPÍTULO 4 – Um diário, duas histórias
14 de março, 15:00h
Acabei de receber uma carta para entrevista na AmbiGen... Há um lado em mim que pula de alegria, mas há outro que está triste... A entrevista é amanhã!
15 de março, 18:03h
Sou o mais novo contratado da AmbiGen. Amanhã eu já começo.
16 de março, 10:42h
É grandioso esse laboratório! E diversidade biológica, então?! Nem se fala! Eu não sabia que havia uma parceria entre o lab e a corporação Marx. Tem alguém olhando desconfiado para mim. Deve ser por causa do meu gravador. Melhor desligar.
11:55h – fui indagado sobre o aparelho e mostrei-o aos seguranças e ao chefe do meu setor, um tal de Marcos Aguiar... ele disse que não haveria problemas em eu usá-lo.
12:03h – acaba de passar por aqui o manda-chuva da AmbiGen, é um francês chamado Belmont...
17 de março, 12:55h
É estranho!!! Muito estranho! O tal de Belmont entrou numa estufa e, simplesmente, desapareceu.
16:09h – estou no banheiro. Como é que pode? Eu vi! Eu vi a estufa vazia. Eu fui lá e vi danada da estufa vazia, sim! Mas há poucos minutos o doutor Belmont saiu de lá. É muito, muuuuuito estranho!
04 de abril, 11:27h
Fazia duas semanas que eu sondava aquele e outros sumiços do doutor Belmont na estufa. Quando eu indaguei a alguns monitores eles me olharam atravessado. Faz cinco minutos que o doutor mandou me chamar na sala dele... Será que eu fiz besteira??? Não! Isso deve ser coisa da minha cabeça. É... É isso mesmo... só coisa da minha cabeça... ... ... Espero!
19:56h – Eu devia ter gravado aquela conversa... uh! “Você tem ambições, Erick?”... “Muito bom, pois só os ambiciosos crescem e podem alçar vôos mais longos”... Menos de um mês... e já fui promovido. Sou agora o engenheiro-chefe do setor de biomas.
07 de abril, 13:01h
Não é um trabalho difícil, mas que, às vezes, incomoda. Tantos experimentos não dão certo.
15 de maio, 16:00h
Belmont me fez uma pergunta, no mínimo, curiosa. Ele me perguntou do que eu seria capaz para que meus experimentos funcionassem? Respondi: “Qualquer coisa!” e ele olhou para mim como se aprovasse o que eu tinha dito. Baixou a cabeça e, se não me engano, acho que vi um leve, mas malicioso, sorriso em sua cara fechada e de poucos amigos.
08 de julho, 08:30h
Mais uma vez eu vejo Belmont entrando na estufa e desaparecendo, quando será que ele vai voltar? O que há ali além de plantas e insetos? E mais, será que eu percebi que ele entra ali e desaparece por horas até?
27 de dezembro, 12:31h
Após um exaustivo mês de testes, eu e minha equipe conseguimos criar uma planta híbrida, bem parecida com uma samambaia, mas com propriedades triplicadas de uma seringueira... Belmont me chamou para ir à sala dele às 14h.
02 de janeiro, 05:36h
Ano novo, vida nova!!! Eu vou aceitar o convite de Belmont, vou morar no lab. Na verdade, numa pequena unidade lateral, mas é melhor do que esse ovo onde moro.
Está fazendo cinco dias que Belmont me chamou na sala dele. Quando entrei, ele olhava fixamente para a janela. Sem nem se virar para mim começou a falar, falava sobre os sonhos de cada uma das pessoas ali, sobre as ambições de cada um, sobre mudanças... Então, de repente, se virou para mim e perguntou:
— Quantas espécies você teve de destruir para obter aquele fantástico híbrido?
Não vacilei, respondi sem nem gaguejar: “Não importa, doutor! O bem e o avanço da ciência e o que realmente importam e nós conseguimos um avanço considerável hoje”. E ele continuou:
— Será que você manteria sua linha de raciocínio se fossem seres humanos no lugar de plantas?
E eu falei: “Claro! Imagine o que não conseguiríamos perdendo algumas poucas vidas sem futuro, como mendigos, drogados, presos com penas perpétuas ou de morte. Tais seres não estariam perdendo nada e ainda ganhariam a oportunidade de fazer o progresso científico alçar vôos cada vez mais longos. Sim, doutor, com certeza eu continuaria mantendo a minha linha de raciocínio!”
Depois disso, Belmont me olhou como se procurasse ver a verdade em meus olhos, virou-se de costas e, olhando novamente para as pessoas no lab, apenas disse:
— Por hoje é só. Você pode ir, depois conversamos.
Mais tarde ele me chamou de novo e me fez a proposta para que eu fosse morar no lab. Me deu um tempo para pensar, disse que eu só precisava dar a resposta depois do ano novo.
03 de janeiro, 12:09h
Putz, eu aceitei a proposta e junto com isso ganhei outra promoção. Cacetada! Eu agora sou do Conclave Interno, o grupo de doutores que é comandado diretamente por Belmont.
10 de janeiro, 17:27h
Apesar de tudo, eu me sinto excluído. Só quem fica aqui no lab com os monitores e os estagiários sou eu, não vejo mais ninguém do Conclave. Ao menos posso continuar minhas pesquisas e fazer as minhas experiências.
03 de maio, 13:00h
Hoje está fazendo quatro meses que eu entrei para o Conclave Interno do AmbiGen. E também vai ser a primeira vez que eu vou entrar na estufa. Até o meu híbrido, que todos dizem ser a minha “samambaia” geneticamente modificada, vive lá e eu nunca havia entrado. Tive outro experimento bem sucedido hoje, outra modificação genética numa planta e, mais uma vez, o doutor Belmont me perguntou o que já havia me perguntado outras vezes: se eu não me arrependia do que fazia com as espécies que usava nos experimentos, e também se eu seria tão inescrupuloso se utilizasse seres humanos. Dessa vez, notei algo diferente em minha própria resposta: foi seca, ríspida, nem sequer olhei nos olhos de Belmont. Agora me pergunto: será que eu sou tão desumano assim?
04 de maio, 00:06h
É simplesmente incrível! Embaixo do suposto laboratório de pesquisas ambientais, há um complexo com maquinário e suporte de altíssima tecnologia. O símbolo da Marx brilha reluzente em cada máquina e equipamento cirúrgico. Bateu até uma saudade, gostaria muito de reencontrar o meu amigo Paulo.
06 de maio, 18:01h
Há exatamente 12 minutos me foi revelado o verdadeiro propósito do laboratório subterrâneo: pesquisa com cobaias humanas. Mais precisamente, genemodificação, mecanomodificação e eletromodificação. Sinceramente, são párias. Mendigos, drogados, homicidas, degenerados. Enfim, ninguém que faça falta.
07 de outubro, 16:00h
Estou indo para uma reunião com uma tal de Rafael Myner. Esse nome, será que tem algo a ver com as indústrias Myner? Não... acho que não. Não importa, já somos subsidiados pela CoMarx.
08 de outubro, 08:04h
Estamos iniciando nosso primeiro teste em genemodificação. Humanóide, sexo masculino, mais ou menos 40 anos.
10 de outubro, 10: 59h
A experiência, que a partir de agora chamarei apenas de E-001, deu seus primeiros sinais de saída da letargia depois dos genemodificadores. Vamos tirá-la dos tanques de eletrólise e reanimá-la.
11 de outubro, 09:00h
Teste na arena. Levamos E-001 para a arena e fizemos diversos testes, a massa corporal de E-001 aumentou em 151%, ele ergueu uma estrutura de cerca de 500 quilos, são cerca de seis vezes o valor de seu próprio peso.
15 de outubro, 17:55h
E-001 faleceu. Infarto massivo do miocárdio.
22 de fevereiro, 07:11h
Perdemos outro experimento. É o quinto desde outubro do ano passado. Todos com o mesmo problema: infarto massivo do miocárdio. Precisamos descobrir porque os corpos não agüentam.
28 de fevereiro, 19:09h
Dessa vez testamos uma modificação genético-eletrônica no espécime. Vejamos quanto tempo irá durar.
03 de março, 15:31h
Arena, registro do experimento E-006:
- Aumento de força: 403%
- Aumento de agilidade: 211%
- Percepção visual: 157%
- Velocidade de raciocínio: 176%
- RCV: 60 – 80 bpm
Simplesmente perfeito!!!
04 de março, 04:33h
Houve uma tragédia agora a pouco. O experimento E-006 escapou, matou dois membros do Conclave – a doutora Alice Nogueira e o nosso genengenheiro Alberto Gusmão. Estou pasmo com o que vejo, as câmeras internas mostram E-006 abrindo um túnel na parede oeste a socos. De acordo com a câmera de registro do quarto-cela de E-006, o experimento sofreu de uma “crise” de consciência. Pena! Temos que pensar em fazer lavagem cerebral agora e precisamos contratar seguranças armados.
30 de junho, 14:00h
Depois do fracasso de E-006, todos os experimentos resultam em sucesso absoluto. A lavagem cerebral retira as possibilidades de “crise” de consciência.
07 de setembro, 09:08
Há algo errado com E-027. Há uma enorme resistência dessa cobaia ao processo de lavagem cerebral. Instantes atrás, o sistema entrou em curto. Vou mandar fazer uma análise genética no experiemnto.
10 de setembro, 07:01h
Não consigo acreditar no que vejo, agora está tudo explicado. Por isso o E-027 é resistente as lavagens cerebrais, ele é um Homo sapiens mutans, um mutante. Hummmm!!! ... Mutantes genética e eletronicamente modificados... perfeito!
· · ·
A cada data que passava, Paulo desconhecia mais o seu amigo de faculdade Erick. Atrocidades, assassinatos, experiências feitas com seres humanos, mutilações. Tudo isso feito com uma frieza que chegava a dar nos nervos. Mesmo assim, continuou a escutar o diário eletrônico de seu colega.
Sobressaltado, algo surgiu na mente do diretor-presidente da CoMarx: o que teria levado aquele homem que um dia já o chamara de amigo a, de repente, transformar-se em um monstro que deixaria Hitler muito feliz e o que aconteceu para que ele me enviasse tais coisas? Crise de consciência? Pela frieza com que descreve os experimentos, não.
· · ·
25 de dezembro, 06:00h
Acabei de acordar e percebi que o coquetel biológico havia acabado. Não morrerei se de repente passar um dia sem tomá-lo. É a primeira vez, desde que entrei para o Conclave Interno que fico sem o coquetel.
26 de dezembro, 21:59h
Me sinto estranho, estou suando frio. Já não sei dizer se ainda sei quem sou.
27 de dezembro, 16:15h
Estive no complexo de celas fazendo a análise biomédica das cobaias. Foi estranho e singular, pois foi a primeira vez que senti remorso daqueles infelizes.
23:33h – Estou deitado em minha cama, pensando no que está acontecendo. Hoje eu peguei de volta o coquetel. O doutor Marcos perguntou se o meu já deveria ter acabado antes do Natal. Respondi que não, que acabara hoje. E ele disse algo que me incomodou:
— É... Acontece. Algumas pessoas são mais suscetíveis e, por isso, o efeito se prolonga mesmo sem tomar o coquetel. Se não fosse assim, já teríamos percebido a mudança.
E quando eu perguntei que mudanças ele respondeu:
— Lembra da Alice e do Alberto? ... Efeito de não tomar o coquetel
Me fiz de entendido e me despedi com o coquetel nas mãos. Não o tomei ainda, vou investigá-lo e saber para o que ele realmente serve.
04 de janeiro, 00:41h
Filhos de uma puta! Durante esse tempo inteiro achei que o coquetel inibia o cansaço físico e mental e ajudava na restauração hormonal, mas, na verdade, ele é um inibidor de sentimentos. Deus! Por isso que somos sempre tão frios e calculistas com o que fazemos. Acho que ainda não descobriram que eu parei de tomar, devido ao fato que a minha personalidade é naturalmente fria. Preciso continuar fingindo que nada aconteceu e pegar regularmente a dose mensal do coquetel, senão serei descoberto. Enquanto isso, vou descobrir o que mais está acontecendo aqui.
21 de março, 12:07h
Deus! Perdoe-me! Nossas cobaias não são mendigos ou outros párias quaisquer. São, sim, pais e mães de família que são monitorados pelo próprio doutor Belmont e escolhidos por características únicas. Eu preciso me controlar. Continuar fingindo. Próxima semana viajarei com Belmont à Europa. Procurarei saber mais sobre onde estão indo parar nossos experimentos... ou melhor... essas pessoas.
19 de outubro, 09:01h
Uma troca de bateria e... voilá! Funciona normalmente. Apesar de que ainda havia carga extra. Cheguei hoje de viagem, não imaginei que fôssemos demorar tanto. As pessoas que transformamos são usadas em guerras na África, contra e a favor do terrorismo no Oriente Médio e de outras formas vis... não importa! Desde que rendam dinheiro. Deus me ajude!
28 de dezembro, 22:26h
Quase que eu me denuncio, hoje. Já não consigo me controlar tanto. Trouxemos um jovem de uns 17 anos. Ele me olhou com tanto medo que baixei a cabeça. O doutor Belmont viu e me indagou o que estava me acontecendo... por sorte, eu estava com o laptop em mãos e disse que estava apenas observando os dados de E-367M. Quatro cobaias que se rebelaram na arena foram fuziladas.
02 de janeiro, 07:51h
Desliguei todas as câmeras utilizando os poderes de E-027... Não, ele não é E-027... É uma pessoa... sem memória e sem sentimentos... Vou libertar os prisioneiros.
03 de janeiro, 02:57h
O que foi que eu fiz, meu Deus? Eu libertei aqueles dois pobres, mas eles não conseguiram escapar, foram mortos dentro do elevador.
07 de julho, 17:33h
Teste... voz... teste... ok! Tudo gravado. Muito obrigado, meninas.
17:37h – Ajudado pelas irmãs Kurkova, consegui modificar meu aparelho de gravação. Ligando-o a um componente auricular que lembra um headphone sou capaz, agora, de transformar minhas ondas mentais em ondas sonoras e gravá-las. Ficou mais fácil de esconder o que estou fazendo.
13 de dezembro, 09:22h
Passamos um bom tempo só aperfeiçoando os experimentos – Deus! Me dá nojo usar esta palavra – sem receber novas vítimas. Estamos trabalhando num tecnotecido volátil que se autodetona se não for banhado por C4H10. Curioso, um gás altamente volátil que faz com o tecnotecido fique estável por cerca de doze horas.
29 de dezembro, 23:58h
Eis a vantagem de se morar no local de trabalho: você tem acesso a tudo, mesmo quando não há ninguém.
Nota mental: Estou roubando os arquivos de pesquisa e o decriptador que revela o que foi feito em cada um de nossos experimentos. Preciso enviar logo. A câmera está vindo em minha direção... passou... posso continuar. Isso... amanhã o computador vai detectar o intruso, preciso concluir a gravação e enviar um malware para o computador central. Naturalmente, o computador eliminará o vírus que receberá a total culpa pela intrusão... isso... mais um pouco... ops, a câmera... passou... voltando... pronto... terminei de carregar os arquivos... agora, o malware... mais alguns segundos e... ok! ... voilá!
06 de janeiro, 10:21h
Está chegando mais uma cobaia. Como o doutor os faz passar pelo primeiro piso? Ora, não conheço nenhuma outra entrada ou saída do lab, a não ser pela entrada térrea da AmbiGen e, para isso, teria que passar pelo elevador e por todo o lab central... Bom, isso é coisa pra se pensar depois. Vamos a cobaia... está vindo... Meu Deus! É um garoto, deve ter entre 13 e 15 anos, cabelos encaracolados numa feição entre triste e alegre. Está com medo... dá pra ver em seus olhos... Belmont desgraçado!
07 de janeiro, 00:09h
Arquivos pessoais das vítimas atualizado. Agora é só levar para o quarto... mas o que é isso? Movimento? A essa hora da noite... O que será? Vou investigar? É a segurança interna, estão levando o garoto que chegou mais cedo para a arena. Não tenho como me aproximar, a área é aberta e a segurança facilmente me veria... mas espere... hummm, a sala de controle das câmeras, o funcionário não está lá... eu só preciso entrar.
00:31h – O garoto está na sala, além da segurança interna, estão Belmont e Aguiar. O que o garoto tem de especial para ser trazido para a arena? Pena que as câmeras não gravam vozes! Mas tudo bem, o garoto não está sendo testado na arena, apenas analisado... não sou muito bom em leitura labial, mas há uma palavra que eles repetem sempre: latência.
08 de janeiro, 11:01h
O garoto se chama Felipe Cadó, pela análise feita em suas células, é um mutante. Poderes desconhecidos ou em latência. É filho de um músico e de uma professora. Toca violão e flauta doce... Que pena! Um futuro e talvez promissor músico tornando-se prisioneiro de Belmont. O fato de ele estar em latência vai fazer com que o doutor queira testar o Propagador nele para ativar o poder do garoto. Espero que não seja necessário, os dois últimos tiveram danos cerebrais irreversíveis e tiveram de ser sacrificados.
11 de fevereiro, 14:31h
Todos os testes com o garoto resultaram em fracasso, ele está sendo levado para a arena, o Propagador já está instalado lá. Espero que ele sobreviva.
15:00h – o Propagador foi ligado e redirecionado para coalizão com o genoma mutante do garoto... Começou... o Propagador disparou um feixe de partículas que deve... Deus, o que está acontecendo!? O feixe sequer chegou a tocar o garoto... e... está voltando... isso mesmo... o feixe reverteu; o Propagador está explodindo, mas o garoto vai morrer... meus olhos não podem negar o que estão vendo... todos os destroços que vêm em direção ao garoto estão voltando, como num REFLUXO.
15:07h – o garoto foi neutralizado. Até as balas voltavam, seis seguranças morreram, um deles conseguiu se aproximar do garoto por trás e o acertou com um cacetete, mas, mesmo assim, recebeu o baque da pancada despendida de volta.
Hummm!!! O poder desse garoto é fantástico, estando em seu campo de visão, nada pode atingi-lo, pois tem seu fluxo revertido em direção contrária a normal e, mesmo fora do seu campo de visão, o que o atingir também será revertido, voltando à direção normal.
17 de março, 13:00h
O garoto Cadó saiu do coma, que maravilha!!! Chegou a hora de começar a agir por dentro para que saibam do que está acontecendo aqui. Mas, antes, preciso evitar que façam alterações genéticas no garoto.
22 de abril, 20:01h
Consegui!!! Consegui!!! Com esses dados em mãos vou convencer Belmont a aguardar cerca de um ano para fazer alterações genéticas e/ou eletrônicas em mutantes. Tempo mais que suficiente para eu poder organizar as fugas.
23 de abril, 21:17h
Ufa! Eu cheguei a pensar que não conseguiria convencer Belmont, mas consegui. Depois de 13 horas de reunião, dezessete garrafas de café e três maços de cigarro, eu consegui!!! Ganhei mais um ano para os nossos mutantes.
08 de maio, 12:37h
Descobri a outra entrada do complexo. Está no terceiro piso. É muito bem escondida. Não fosse o destino me fazer tropeçar e cair dentro de uma das celas vazias e eu não teria descoberto a passagem. Preciso descobrir onde vai dar, se há monitoramento e, só então, poderei bolar um plano.
09 de maio, 14:44h
Chegaram quatro novos mutantes.
10 de maio, 01:49h
Que o destino me ajude! O próprio Belmont me levou até a passagem, mostrou-me as câmeras e o setor de monitoramento, a saída que está a cerca de quatro quilômetros do complexo... Hummm! Há dois seguranças muito bem armados, com a nossa tecnologia. Eu não sabia que o doutor confiava tanto em mim. E eu irei traí-lo? Sim! O que está acontecendo aqui precisa ser evitado...
Já ganhei tempo, preciso agora salvar vidas.
03:08h – não consigo dormir, minha consciência não me deixa dormir me lembrando de todas as vidas que eu tirei em nome da ciência.
Será que um dia eu serei perdoado??? Deus!!! Por favor, me perdoe! Me ajude!
13 de maio, 0915h
Mais duas cobaias jovens. Deixamos de pegar maltrapilhos, fugimos de nosso limite. Pela maneira como estão vestidos devem ser de famílias ricas. Que poderes possuem? Que sonhos têm? Meu Deus! O que estamos fazendo???
17 de julho, 16:01h
A garota que chegou no início de maio é uma tecnocinética, um dos garotos é um mutante em latência e o outro apresenta sob estresse uma força bruta descomunal. Os outros que chegaram depois desenvolveram bem seus poderes. Cadó está controlando seu poder maravilhosamente. Todos passaram a chamá-lo de Refluxo... bem apropriado.
A vantagem do ano ganho é que, além de passarem a conhecer seus poderes, estes mutantes podem, a partir deste vínculo de amizade que estão criando entre si, juntar-se para até viverem uma vida melhor.
29 de novembro, 3:00h
Perfeito! Codec paralisou todas as câmeras, Atlas mapeou o local por onde passaremos no mesmo instante em que Sincronia abria as celas de Refluxo, Muro, Cynese e Decodificadora.
— Vamos lá, pessoal! Liguem os transcodens... isso... 3:01h, Codec, quanto tempo?
— Três minutos, professor!
“Professor? Que ironia.”
— Professor, algum problema?
— Não, Sincronia. Apenas pensei em algo. Deixem pra lá...vamos... agora.
Estamos na passagem, conseguimos chegar a tempo... estou salvando vidas... é isso! Estou salvando vidas! Sala de monitoramento... Estamos no meio do caminho.
— Decodificadora, é com você!
— Sim, professor.
Que poder fascinante, Amália “lê” qualquer forma de linguagem e decifra qualquer código, simplesmente ao olhá-lo. Como é veloz a velocidade de aprendizado dela. Semana passada dei-lhe uma gramática japonesa e em um dia ela já estava recitando poemas do Sengoku-Jidai*
— Pronto, terminei. Câmeras desligadas por... exatamente 10 minutos.
— É pouco! Mas tem que dar. Vamos!
Que garotos magníficos: Codec é Alderi Júnior, 15 anos, com apenas um toque ele consegue modificar o funcionamento de qualquer maquinário, consertando-o ou fazendo suas peças falharem. Atlas é Allan Rafael, 16 anos, seu cérebro ainda é uma incógnita, mas ele consegue mapear e visualizar as nuances de possibilidades existentes para qualquer situação... Vencê-lo em xadrez? Impossível... Lance-o em um labirinto e, poucos minutos depois, ele sairá de lá. Sincronia é Micaela Patrícia, 16 anos, o que dizer dela? Nem a analisamos direito, pouco sabemos... talvez um tipo diferente de telecinesia... Não sei... O que se sabe dela é que é capaz de fazer várias coisas: máquinas, objetos e, às vezes, até pessoas entrarem em sincronia com o que ela está fazendo. Ela já chegou aqui controlando o seu poder. Refluxo é Felipe Cadó, o mais velho entre eles, 17 anos, capaz de fazer qualquer coisa entrar em um fluxo oposto ao seu normal. Muro é Phelipe Rubian, um metro e meio de músculos e 16 anos vividos fugindo de um pai alcoólatra... descobriu seus poderes quando o pai bêbado esfaqueou a única pessoa que ele amava: a mãe. Pena para o pai dele, Muro é capaz de aumentar a sua força de maneira descomunal e, sob estresse, sua pele fica dura e acinzentada com um verdadeiro muro. Cynese é Ana Paula Lins, 16 anos e uma mutação comum nos dias de hoje, a telecinese de máquina ou, como preferimos chamar, tecnopatia... Bem, chegamos.
— Quanto tempo, Decodificadora?
— 22 segundos, professor.
— Bastante tempo. Muro é com você. Sincronia e Refluxo fiquem alerta, os demais, para trás.
Ainda bem que o pequeno Muro tem boa índole... Quase uma tonelada em um soco... Ele é capaz de esmagar um carro!
— Tudo resolvido, professor.
— Muito bem, Muro!... Vamos, garotos, à Liberdade!!!
Ah, tá!!! Eu fiz tudo isso e esqueci de como eu vou voltar ao complexo... É... HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! É isso mesmo... fazer o que... é uma longa caminhada até o outro lado HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA!
· · ·
Durante cerca de três horas, Paulo escutou o relato de um amigo que foi do inferno ao céu enquanto exercia sua profissão, e de como o ser humano é capaz de ser frio, cruel e maligno em nome da ciência e da ganância.
Nos anos que se seguiram, Erick libertou cerca de cem mutantes sem nunca ter sido descoberto. Fora das paredes da AmbiGen, sem querer, serviu de incentivo para a união de um grupo de jovens mutantes que se autodenominou GERAÇÃO MUTANTE ou, como todos passaram a chamá-los, Geração M.
Paulo escutou e reescutou toda a história, os últimos relatos contidos no pequeno cd eram:
02 de janeiro, 23:57h
Fui descoberto... Tenho absoluta certeza disso. Me deram um sedativo. O doutor Belmont já não confia em mim. Tenho que enviar os relatórios e as pesquisas o mais urgentemente possível. Não adianta tentar fugir... algo me diz que estou sendo monitorado. Preciso de ajuda! Mas não posso envolver a Geração M... Depois de tantas fugas o doutor contratou mercenários especializados em caçar mutantes chamados de Cães de Guerra... Como eu faço??? Como? ... Como isso pode sair daqui sem que ninguém descubra? ... Meu Deus!!! HA! HA! HA! HA! Como eu sou ingênuo ... HA! HA! ... É claro como água! Como pude ser tão idiota, a rede de esgotos. Não é monitorada, pois não possui passagem para objetos muito grandes, não há preocupação com ela. É isso!!!
03 de janeiro, 00:44h
Pronto, os cds de relatórios e pesquisas estão lacrados de forma que a água dos esgotos não os danifiquem, agora é só lançá-los ao vaso e... voilá!!!... Bendito vaso sanitário. Agora o próximo passo: avisar alguém... Não! Não alguém qualquer ... Paulo precisa saber o que está acontecendo aqui... Ora, mas que tolice a minha, amanhã é o dia de entrega do relatório anual da AmbiGen, não ocorre vigília ao pacote e vai direto para a CoMarx , preciso enviar o que tenho. Que pena que mandei os outros arquivos descarga abaixo, mas ele os encontrará depois de receber este meu presente.
06:06h – Pacote pronto, agora é só incluir na entrega da Marx. Isso é facílimo, só preciso esperar que venha para o meu setor... Ora, doutor Belmont, eu, sua maior aquisição, serei também a sua ruína... Que irônico!!!
Fim das minhas gravações... espero que isto chegue ao meu amigo Paulo e que ele me perdoe. Agora é hora de fazer o Projeto Alfa funcionar. Espero estar vivo depois disso.
· · ·
Um sibilo.
Inicialmente tímido e imperceptível, adentra a sala do 25º andar de edifício Marx. É um prenúncio... Um vento de mudança que torna o rosto de Paulo Henrique Marx cada vez mais austero.
Um último olhar sob a mesa, um pedido:
— Micarla?
— Sim, senhor Paulo?
— Quero uma equipe de mergulhadores pronta.
— Para quando, senhor?
— Pra ontem.
— Agora mesmo.
— Ah, Micarla, traga-me um café bem forte!
Corporação Marx
12h
Um cansado e bem sucedido empresário senta-se e suspira. Um suspiro aliviado? De forma alguma. Frustrante, essa seria a palavra para definir o suspiro de Paulo Henrique, diretor-presidente da Corporação Marx. Até o momento, quase nenhuma notícia sobre a AmbiGen.
— Senhor Paulo?
— Sim, Micarla.
— Err... Acabou de chegar uma encomenda para o senhor... quer dizer... não sei se é para o senhor, mas...
— Explique melhor: o que está acontecendo?
— Bem, há uma encomenda aqui, mas não tem remetente, só destinatário. Está escrito: “para meu amigo Paulo, corporação Marx”.
“Ah, mais essa agora!” – pensa Paulo enquanto se prepara para falar:
— Já fez análise espectográfica?
— Sim, senhor! É só um aparelho eletrônico, um tipo de gravador.
— Traga-o.
— Imediatamente, senhor Paulo.
Com a caixa em mãos, Paulo suspira uma outra vez e pensa: “Será mais uma decepção?” Mecanicamente, suas mãos abrem o invólucro de papelão enquanto seus pensamentos o levam de volta à coletiva de imprensa e a enxurrada de perguntas a que foi levado.
“George Nobre do Diário de Notícias, é verdade que a AmbiGen era um laboratório de armas químicas?”
“Antonielle Assunção do O Dia, como o senhor pode explicar o laboratório de altíssima tecnologia embaixo do complexo da AmbiGen?”
“Edson Amorim do Noticiário Padrão, da TV Ponta Negra. Que atrocidades eram cometidas nos subterrâneos da ambiGen? Eram criadas aberrações mutantes como seus guarda-costas?”
“Foi duro enfrentar todas aquelas perguntas, mas... o que é isso? Hummm... um minigravador? Sim... e há também um cd, na verdade, um mini-cd... espere... há algo escrito: para Paulo Henrique Câmara, de Erick Miller.
Meu Deus, a quanto tempo eu não escuto esse nome: Paulo Henrique Câmara, dá até vontade de rir... Bom, não é hora para certas lembranças... Erick Miller? Sim!!! Meu amigo da faculdade, mas faz quase dez anos que não nos vemos, desde que ele foi contratado pelo AmbiGen...”
A menção do nome da AmbiGen fez Paulo voltar ao presente e a situação atual. Com certeza, aquele cd contém informação essencial ao que estava acontecendo desde aquela fatídica manhã.
Cd no aparelho... Antes de ligar um aviso ao interfone:
— Micarla, não quero ser interrompido por hoje. Não estou para quem não sabe que eu estou e caso Comando ligue, você tem carta branca e responsabilidade.
— Sim, senhor Paulo.
Mãos outrora confiantes agora se aproximam do pequeno aparelho. Um toque suave inicia a transmissão.
CAPÍTULO 4 – Um diário, duas histórias
14 de março, 15:00h
Acabei de receber uma carta para entrevista na AmbiGen... Há um lado em mim que pula de alegria, mas há outro que está triste... A entrevista é amanhã!
15 de março, 18:03h
Sou o mais novo contratado da AmbiGen. Amanhã eu já começo.
16 de março, 10:42h
É grandioso esse laboratório! E diversidade biológica, então?! Nem se fala! Eu não sabia que havia uma parceria entre o lab e a corporação Marx. Tem alguém olhando desconfiado para mim. Deve ser por causa do meu gravador. Melhor desligar.
11:55h – fui indagado sobre o aparelho e mostrei-o aos seguranças e ao chefe do meu setor, um tal de Marcos Aguiar... ele disse que não haveria problemas em eu usá-lo.
12:03h – acaba de passar por aqui o manda-chuva da AmbiGen, é um francês chamado Belmont...
17 de março, 12:55h
É estranho!!! Muito estranho! O tal de Belmont entrou numa estufa e, simplesmente, desapareceu.
16:09h – estou no banheiro. Como é que pode? Eu vi! Eu vi a estufa vazia. Eu fui lá e vi danada da estufa vazia, sim! Mas há poucos minutos o doutor Belmont saiu de lá. É muito, muuuuuito estranho!
04 de abril, 11:27h
Fazia duas semanas que eu sondava aquele e outros sumiços do doutor Belmont na estufa. Quando eu indaguei a alguns monitores eles me olharam atravessado. Faz cinco minutos que o doutor mandou me chamar na sala dele... Será que eu fiz besteira??? Não! Isso deve ser coisa da minha cabeça. É... É isso mesmo... só coisa da minha cabeça... ... ... Espero!
19:56h – Eu devia ter gravado aquela conversa... uh! “Você tem ambições, Erick?”... “Muito bom, pois só os ambiciosos crescem e podem alçar vôos mais longos”... Menos de um mês... e já fui promovido. Sou agora o engenheiro-chefe do setor de biomas.
07 de abril, 13:01h
Não é um trabalho difícil, mas que, às vezes, incomoda. Tantos experimentos não dão certo.
15 de maio, 16:00h
Belmont me fez uma pergunta, no mínimo, curiosa. Ele me perguntou do que eu seria capaz para que meus experimentos funcionassem? Respondi: “Qualquer coisa!” e ele olhou para mim como se aprovasse o que eu tinha dito. Baixou a cabeça e, se não me engano, acho que vi um leve, mas malicioso, sorriso em sua cara fechada e de poucos amigos.
08 de julho, 08:30h
Mais uma vez eu vejo Belmont entrando na estufa e desaparecendo, quando será que ele vai voltar? O que há ali além de plantas e insetos? E mais, será que eu percebi que ele entra ali e desaparece por horas até?
27 de dezembro, 12:31h
Após um exaustivo mês de testes, eu e minha equipe conseguimos criar uma planta híbrida, bem parecida com uma samambaia, mas com propriedades triplicadas de uma seringueira... Belmont me chamou para ir à sala dele às 14h.
02 de janeiro, 05:36h
Ano novo, vida nova!!! Eu vou aceitar o convite de Belmont, vou morar no lab. Na verdade, numa pequena unidade lateral, mas é melhor do que esse ovo onde moro.
Está fazendo cinco dias que Belmont me chamou na sala dele. Quando entrei, ele olhava fixamente para a janela. Sem nem se virar para mim começou a falar, falava sobre os sonhos de cada uma das pessoas ali, sobre as ambições de cada um, sobre mudanças... Então, de repente, se virou para mim e perguntou:
— Quantas espécies você teve de destruir para obter aquele fantástico híbrido?
Não vacilei, respondi sem nem gaguejar: “Não importa, doutor! O bem e o avanço da ciência e o que realmente importam e nós conseguimos um avanço considerável hoje”. E ele continuou:
— Será que você manteria sua linha de raciocínio se fossem seres humanos no lugar de plantas?
E eu falei: “Claro! Imagine o que não conseguiríamos perdendo algumas poucas vidas sem futuro, como mendigos, drogados, presos com penas perpétuas ou de morte. Tais seres não estariam perdendo nada e ainda ganhariam a oportunidade de fazer o progresso científico alçar vôos cada vez mais longos. Sim, doutor, com certeza eu continuaria mantendo a minha linha de raciocínio!”
Depois disso, Belmont me olhou como se procurasse ver a verdade em meus olhos, virou-se de costas e, olhando novamente para as pessoas no lab, apenas disse:
— Por hoje é só. Você pode ir, depois conversamos.
Mais tarde ele me chamou de novo e me fez a proposta para que eu fosse morar no lab. Me deu um tempo para pensar, disse que eu só precisava dar a resposta depois do ano novo.
03 de janeiro, 12:09h
Putz, eu aceitei a proposta e junto com isso ganhei outra promoção. Cacetada! Eu agora sou do Conclave Interno, o grupo de doutores que é comandado diretamente por Belmont.
10 de janeiro, 17:27h
Apesar de tudo, eu me sinto excluído. Só quem fica aqui no lab com os monitores e os estagiários sou eu, não vejo mais ninguém do Conclave. Ao menos posso continuar minhas pesquisas e fazer as minhas experiências.
03 de maio, 13:00h
Hoje está fazendo quatro meses que eu entrei para o Conclave Interno do AmbiGen. E também vai ser a primeira vez que eu vou entrar na estufa. Até o meu híbrido, que todos dizem ser a minha “samambaia” geneticamente modificada, vive lá e eu nunca havia entrado. Tive outro experimento bem sucedido hoje, outra modificação genética numa planta e, mais uma vez, o doutor Belmont me perguntou o que já havia me perguntado outras vezes: se eu não me arrependia do que fazia com as espécies que usava nos experimentos, e também se eu seria tão inescrupuloso se utilizasse seres humanos. Dessa vez, notei algo diferente em minha própria resposta: foi seca, ríspida, nem sequer olhei nos olhos de Belmont. Agora me pergunto: será que eu sou tão desumano assim?
04 de maio, 00:06h
É simplesmente incrível! Embaixo do suposto laboratório de pesquisas ambientais, há um complexo com maquinário e suporte de altíssima tecnologia. O símbolo da Marx brilha reluzente em cada máquina e equipamento cirúrgico. Bateu até uma saudade, gostaria muito de reencontrar o meu amigo Paulo.
06 de maio, 18:01h
Há exatamente 12 minutos me foi revelado o verdadeiro propósito do laboratório subterrâneo: pesquisa com cobaias humanas. Mais precisamente, genemodificação, mecanomodificação e eletromodificação. Sinceramente, são párias. Mendigos, drogados, homicidas, degenerados. Enfim, ninguém que faça falta.
07 de outubro, 16:00h
Estou indo para uma reunião com uma tal de Rafael Myner. Esse nome, será que tem algo a ver com as indústrias Myner? Não... acho que não. Não importa, já somos subsidiados pela CoMarx.
08 de outubro, 08:04h
Estamos iniciando nosso primeiro teste em genemodificação. Humanóide, sexo masculino, mais ou menos 40 anos.
10 de outubro, 10: 59h
A experiência, que a partir de agora chamarei apenas de E-001, deu seus primeiros sinais de saída da letargia depois dos genemodificadores. Vamos tirá-la dos tanques de eletrólise e reanimá-la.
11 de outubro, 09:00h
Teste na arena. Levamos E-001 para a arena e fizemos diversos testes, a massa corporal de E-001 aumentou em 151%, ele ergueu uma estrutura de cerca de 500 quilos, são cerca de seis vezes o valor de seu próprio peso.
15 de outubro, 17:55h
E-001 faleceu. Infarto massivo do miocárdio.
22 de fevereiro, 07:11h
Perdemos outro experimento. É o quinto desde outubro do ano passado. Todos com o mesmo problema: infarto massivo do miocárdio. Precisamos descobrir porque os corpos não agüentam.
28 de fevereiro, 19:09h
Dessa vez testamos uma modificação genético-eletrônica no espécime. Vejamos quanto tempo irá durar.
03 de março, 15:31h
Arena, registro do experimento E-006:
- Aumento de força: 403%
- Aumento de agilidade: 211%
- Percepção visual: 157%
- Velocidade de raciocínio: 176%
- RCV: 60 – 80 bpm
Simplesmente perfeito!!!
04 de março, 04:33h
Houve uma tragédia agora a pouco. O experimento E-006 escapou, matou dois membros do Conclave – a doutora Alice Nogueira e o nosso genengenheiro Alberto Gusmão. Estou pasmo com o que vejo, as câmeras internas mostram E-006 abrindo um túnel na parede oeste a socos. De acordo com a câmera de registro do quarto-cela de E-006, o experimento sofreu de uma “crise” de consciência. Pena! Temos que pensar em fazer lavagem cerebral agora e precisamos contratar seguranças armados.
30 de junho, 14:00h
Depois do fracasso de E-006, todos os experimentos resultam em sucesso absoluto. A lavagem cerebral retira as possibilidades de “crise” de consciência.
07 de setembro, 09:08
Há algo errado com E-027. Há uma enorme resistência dessa cobaia ao processo de lavagem cerebral. Instantes atrás, o sistema entrou em curto. Vou mandar fazer uma análise genética no experiemnto.
10 de setembro, 07:01h
Não consigo acreditar no que vejo, agora está tudo explicado. Por isso o E-027 é resistente as lavagens cerebrais, ele é um Homo sapiens mutans, um mutante. Hummmm!!! ... Mutantes genética e eletronicamente modificados... perfeito!
· · ·
A cada data que passava, Paulo desconhecia mais o seu amigo de faculdade Erick. Atrocidades, assassinatos, experiências feitas com seres humanos, mutilações. Tudo isso feito com uma frieza que chegava a dar nos nervos. Mesmo assim, continuou a escutar o diário eletrônico de seu colega.
Sobressaltado, algo surgiu na mente do diretor-presidente da CoMarx: o que teria levado aquele homem que um dia já o chamara de amigo a, de repente, transformar-se em um monstro que deixaria Hitler muito feliz e o que aconteceu para que ele me enviasse tais coisas? Crise de consciência? Pela frieza com que descreve os experimentos, não.
· · ·
25 de dezembro, 06:00h
Acabei de acordar e percebi que o coquetel biológico havia acabado. Não morrerei se de repente passar um dia sem tomá-lo. É a primeira vez, desde que entrei para o Conclave Interno que fico sem o coquetel.
26 de dezembro, 21:59h
Me sinto estranho, estou suando frio. Já não sei dizer se ainda sei quem sou.
27 de dezembro, 16:15h
Estive no complexo de celas fazendo a análise biomédica das cobaias. Foi estranho e singular, pois foi a primeira vez que senti remorso daqueles infelizes.
23:33h – Estou deitado em minha cama, pensando no que está acontecendo. Hoje eu peguei de volta o coquetel. O doutor Marcos perguntou se o meu já deveria ter acabado antes do Natal. Respondi que não, que acabara hoje. E ele disse algo que me incomodou:
— É... Acontece. Algumas pessoas são mais suscetíveis e, por isso, o efeito se prolonga mesmo sem tomar o coquetel. Se não fosse assim, já teríamos percebido a mudança.
E quando eu perguntei que mudanças ele respondeu:
— Lembra da Alice e do Alberto? ... Efeito de não tomar o coquetel
Me fiz de entendido e me despedi com o coquetel nas mãos. Não o tomei ainda, vou investigá-lo e saber para o que ele realmente serve.
04 de janeiro, 00:41h
Filhos de uma puta! Durante esse tempo inteiro achei que o coquetel inibia o cansaço físico e mental e ajudava na restauração hormonal, mas, na verdade, ele é um inibidor de sentimentos. Deus! Por isso que somos sempre tão frios e calculistas com o que fazemos. Acho que ainda não descobriram que eu parei de tomar, devido ao fato que a minha personalidade é naturalmente fria. Preciso continuar fingindo que nada aconteceu e pegar regularmente a dose mensal do coquetel, senão serei descoberto. Enquanto isso, vou descobrir o que mais está acontecendo aqui.
21 de março, 12:07h
Deus! Perdoe-me! Nossas cobaias não são mendigos ou outros párias quaisquer. São, sim, pais e mães de família que são monitorados pelo próprio doutor Belmont e escolhidos por características únicas. Eu preciso me controlar. Continuar fingindo. Próxima semana viajarei com Belmont à Europa. Procurarei saber mais sobre onde estão indo parar nossos experimentos... ou melhor... essas pessoas.
19 de outubro, 09:01h
Uma troca de bateria e... voilá! Funciona normalmente. Apesar de que ainda havia carga extra. Cheguei hoje de viagem, não imaginei que fôssemos demorar tanto. As pessoas que transformamos são usadas em guerras na África, contra e a favor do terrorismo no Oriente Médio e de outras formas vis... não importa! Desde que rendam dinheiro. Deus me ajude!
28 de dezembro, 22:26h
Quase que eu me denuncio, hoje. Já não consigo me controlar tanto. Trouxemos um jovem de uns 17 anos. Ele me olhou com tanto medo que baixei a cabeça. O doutor Belmont viu e me indagou o que estava me acontecendo... por sorte, eu estava com o laptop em mãos e disse que estava apenas observando os dados de E-367M. Quatro cobaias que se rebelaram na arena foram fuziladas.
02 de janeiro, 07:51h
Desliguei todas as câmeras utilizando os poderes de E-027... Não, ele não é E-027... É uma pessoa... sem memória e sem sentimentos... Vou libertar os prisioneiros.
03 de janeiro, 02:57h
O que foi que eu fiz, meu Deus? Eu libertei aqueles dois pobres, mas eles não conseguiram escapar, foram mortos dentro do elevador.
07 de julho, 17:33h
Teste... voz... teste... ok! Tudo gravado. Muito obrigado, meninas.
17:37h – Ajudado pelas irmãs Kurkova, consegui modificar meu aparelho de gravação. Ligando-o a um componente auricular que lembra um headphone sou capaz, agora, de transformar minhas ondas mentais em ondas sonoras e gravá-las. Ficou mais fácil de esconder o que estou fazendo.
13 de dezembro, 09:22h
Passamos um bom tempo só aperfeiçoando os experimentos – Deus! Me dá nojo usar esta palavra – sem receber novas vítimas. Estamos trabalhando num tecnotecido volátil que se autodetona se não for banhado por C4H10. Curioso, um gás altamente volátil que faz com o tecnotecido fique estável por cerca de doze horas.
29 de dezembro, 23:58h
Eis a vantagem de se morar no local de trabalho: você tem acesso a tudo, mesmo quando não há ninguém.
Nota mental: Estou roubando os arquivos de pesquisa e o decriptador que revela o que foi feito em cada um de nossos experimentos. Preciso enviar logo. A câmera está vindo em minha direção... passou... posso continuar. Isso... amanhã o computador vai detectar o intruso, preciso concluir a gravação e enviar um malware para o computador central. Naturalmente, o computador eliminará o vírus que receberá a total culpa pela intrusão... isso... mais um pouco... ops, a câmera... passou... voltando... pronto... terminei de carregar os arquivos... agora, o malware... mais alguns segundos e... ok! ... voilá!
06 de janeiro, 10:21h
Está chegando mais uma cobaia. Como o doutor os faz passar pelo primeiro piso? Ora, não conheço nenhuma outra entrada ou saída do lab, a não ser pela entrada térrea da AmbiGen e, para isso, teria que passar pelo elevador e por todo o lab central... Bom, isso é coisa pra se pensar depois. Vamos a cobaia... está vindo... Meu Deus! É um garoto, deve ter entre 13 e 15 anos, cabelos encaracolados numa feição entre triste e alegre. Está com medo... dá pra ver em seus olhos... Belmont desgraçado!
07 de janeiro, 00:09h
Arquivos pessoais das vítimas atualizado. Agora é só levar para o quarto... mas o que é isso? Movimento? A essa hora da noite... O que será? Vou investigar? É a segurança interna, estão levando o garoto que chegou mais cedo para a arena. Não tenho como me aproximar, a área é aberta e a segurança facilmente me veria... mas espere... hummm, a sala de controle das câmeras, o funcionário não está lá... eu só preciso entrar.
00:31h – O garoto está na sala, além da segurança interna, estão Belmont e Aguiar. O que o garoto tem de especial para ser trazido para a arena? Pena que as câmeras não gravam vozes! Mas tudo bem, o garoto não está sendo testado na arena, apenas analisado... não sou muito bom em leitura labial, mas há uma palavra que eles repetem sempre: latência.
08 de janeiro, 11:01h
O garoto se chama Felipe Cadó, pela análise feita em suas células, é um mutante. Poderes desconhecidos ou em latência. É filho de um músico e de uma professora. Toca violão e flauta doce... Que pena! Um futuro e talvez promissor músico tornando-se prisioneiro de Belmont. O fato de ele estar em latência vai fazer com que o doutor queira testar o Propagador nele para ativar o poder do garoto. Espero que não seja necessário, os dois últimos tiveram danos cerebrais irreversíveis e tiveram de ser sacrificados.
11 de fevereiro, 14:31h
Todos os testes com o garoto resultaram em fracasso, ele está sendo levado para a arena, o Propagador já está instalado lá. Espero que ele sobreviva.
15:00h – o Propagador foi ligado e redirecionado para coalizão com o genoma mutante do garoto... Começou... o Propagador disparou um feixe de partículas que deve... Deus, o que está acontecendo!? O feixe sequer chegou a tocar o garoto... e... está voltando... isso mesmo... o feixe reverteu; o Propagador está explodindo, mas o garoto vai morrer... meus olhos não podem negar o que estão vendo... todos os destroços que vêm em direção ao garoto estão voltando, como num REFLUXO.
15:07h – o garoto foi neutralizado. Até as balas voltavam, seis seguranças morreram, um deles conseguiu se aproximar do garoto por trás e o acertou com um cacetete, mas, mesmo assim, recebeu o baque da pancada despendida de volta.
Hummm!!! O poder desse garoto é fantástico, estando em seu campo de visão, nada pode atingi-lo, pois tem seu fluxo revertido em direção contrária a normal e, mesmo fora do seu campo de visão, o que o atingir também será revertido, voltando à direção normal.
17 de março, 13:00h
O garoto Cadó saiu do coma, que maravilha!!! Chegou a hora de começar a agir por dentro para que saibam do que está acontecendo aqui. Mas, antes, preciso evitar que façam alterações genéticas no garoto.
22 de abril, 20:01h
Consegui!!! Consegui!!! Com esses dados em mãos vou convencer Belmont a aguardar cerca de um ano para fazer alterações genéticas e/ou eletrônicas em mutantes. Tempo mais que suficiente para eu poder organizar as fugas.
23 de abril, 21:17h
Ufa! Eu cheguei a pensar que não conseguiria convencer Belmont, mas consegui. Depois de 13 horas de reunião, dezessete garrafas de café e três maços de cigarro, eu consegui!!! Ganhei mais um ano para os nossos mutantes.
08 de maio, 12:37h
Descobri a outra entrada do complexo. Está no terceiro piso. É muito bem escondida. Não fosse o destino me fazer tropeçar e cair dentro de uma das celas vazias e eu não teria descoberto a passagem. Preciso descobrir onde vai dar, se há monitoramento e, só então, poderei bolar um plano.
09 de maio, 14:44h
Chegaram quatro novos mutantes.
10 de maio, 01:49h
Que o destino me ajude! O próprio Belmont me levou até a passagem, mostrou-me as câmeras e o setor de monitoramento, a saída que está a cerca de quatro quilômetros do complexo... Hummm! Há dois seguranças muito bem armados, com a nossa tecnologia. Eu não sabia que o doutor confiava tanto em mim. E eu irei traí-lo? Sim! O que está acontecendo aqui precisa ser evitado...
Já ganhei tempo, preciso agora salvar vidas.
03:08h – não consigo dormir, minha consciência não me deixa dormir me lembrando de todas as vidas que eu tirei em nome da ciência.
Será que um dia eu serei perdoado??? Deus!!! Por favor, me perdoe! Me ajude!
13 de maio, 0915h
Mais duas cobaias jovens. Deixamos de pegar maltrapilhos, fugimos de nosso limite. Pela maneira como estão vestidos devem ser de famílias ricas. Que poderes possuem? Que sonhos têm? Meu Deus! O que estamos fazendo???
17 de julho, 16:01h
A garota que chegou no início de maio é uma tecnocinética, um dos garotos é um mutante em latência e o outro apresenta sob estresse uma força bruta descomunal. Os outros que chegaram depois desenvolveram bem seus poderes. Cadó está controlando seu poder maravilhosamente. Todos passaram a chamá-lo de Refluxo... bem apropriado.
A vantagem do ano ganho é que, além de passarem a conhecer seus poderes, estes mutantes podem, a partir deste vínculo de amizade que estão criando entre si, juntar-se para até viverem uma vida melhor.
29 de novembro, 3:00h
Perfeito! Codec paralisou todas as câmeras, Atlas mapeou o local por onde passaremos no mesmo instante em que Sincronia abria as celas de Refluxo, Muro, Cynese e Decodificadora.
— Vamos lá, pessoal! Liguem os transcodens... isso... 3:01h, Codec, quanto tempo?
— Três minutos, professor!
“Professor? Que ironia.”
— Professor, algum problema?
— Não, Sincronia. Apenas pensei em algo. Deixem pra lá...vamos... agora.
Estamos na passagem, conseguimos chegar a tempo... estou salvando vidas... é isso! Estou salvando vidas! Sala de monitoramento... Estamos no meio do caminho.
— Decodificadora, é com você!
— Sim, professor.
Que poder fascinante, Amália “lê” qualquer forma de linguagem e decifra qualquer código, simplesmente ao olhá-lo. Como é veloz a velocidade de aprendizado dela. Semana passada dei-lhe uma gramática japonesa e em um dia ela já estava recitando poemas do Sengoku-Jidai*
— Pronto, terminei. Câmeras desligadas por... exatamente 10 minutos.
— É pouco! Mas tem que dar. Vamos!
Que garotos magníficos: Codec é Alderi Júnior, 15 anos, com apenas um toque ele consegue modificar o funcionamento de qualquer maquinário, consertando-o ou fazendo suas peças falharem. Atlas é Allan Rafael, 16 anos, seu cérebro ainda é uma incógnita, mas ele consegue mapear e visualizar as nuances de possibilidades existentes para qualquer situação... Vencê-lo em xadrez? Impossível... Lance-o em um labirinto e, poucos minutos depois, ele sairá de lá. Sincronia é Micaela Patrícia, 16 anos, o que dizer dela? Nem a analisamos direito, pouco sabemos... talvez um tipo diferente de telecinesia... Não sei... O que se sabe dela é que é capaz de fazer várias coisas: máquinas, objetos e, às vezes, até pessoas entrarem em sincronia com o que ela está fazendo. Ela já chegou aqui controlando o seu poder. Refluxo é Felipe Cadó, o mais velho entre eles, 17 anos, capaz de fazer qualquer coisa entrar em um fluxo oposto ao seu normal. Muro é Phelipe Rubian, um metro e meio de músculos e 16 anos vividos fugindo de um pai alcoólatra... descobriu seus poderes quando o pai bêbado esfaqueou a única pessoa que ele amava: a mãe. Pena para o pai dele, Muro é capaz de aumentar a sua força de maneira descomunal e, sob estresse, sua pele fica dura e acinzentada com um verdadeiro muro. Cynese é Ana Paula Lins, 16 anos e uma mutação comum nos dias de hoje, a telecinese de máquina ou, como preferimos chamar, tecnopatia... Bem, chegamos.
— Quanto tempo, Decodificadora?
— 22 segundos, professor.
— Bastante tempo. Muro é com você. Sincronia e Refluxo fiquem alerta, os demais, para trás.
Ainda bem que o pequeno Muro tem boa índole... Quase uma tonelada em um soco... Ele é capaz de esmagar um carro!
— Tudo resolvido, professor.
— Muito bem, Muro!... Vamos, garotos, à Liberdade!!!
Ah, tá!!! Eu fiz tudo isso e esqueci de como eu vou voltar ao complexo... É... HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! É isso mesmo... fazer o que... é uma longa caminhada até o outro lado HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA! HA!
· · ·
Durante cerca de três horas, Paulo escutou o relato de um amigo que foi do inferno ao céu enquanto exercia sua profissão, e de como o ser humano é capaz de ser frio, cruel e maligno em nome da ciência e da ganância.
Nos anos que se seguiram, Erick libertou cerca de cem mutantes sem nunca ter sido descoberto. Fora das paredes da AmbiGen, sem querer, serviu de incentivo para a união de um grupo de jovens mutantes que se autodenominou GERAÇÃO MUTANTE ou, como todos passaram a chamá-los, Geração M.
Paulo escutou e reescutou toda a história, os últimos relatos contidos no pequeno cd eram:
02 de janeiro, 23:57h
Fui descoberto... Tenho absoluta certeza disso. Me deram um sedativo. O doutor Belmont já não confia em mim. Tenho que enviar os relatórios e as pesquisas o mais urgentemente possível. Não adianta tentar fugir... algo me diz que estou sendo monitorado. Preciso de ajuda! Mas não posso envolver a Geração M... Depois de tantas fugas o doutor contratou mercenários especializados em caçar mutantes chamados de Cães de Guerra... Como eu faço??? Como? ... Como isso pode sair daqui sem que ninguém descubra? ... Meu Deus!!! HA! HA! HA! HA! Como eu sou ingênuo ... HA! HA! ... É claro como água! Como pude ser tão idiota, a rede de esgotos. Não é monitorada, pois não possui passagem para objetos muito grandes, não há preocupação com ela. É isso!!!
03 de janeiro, 00:44h
Pronto, os cds de relatórios e pesquisas estão lacrados de forma que a água dos esgotos não os danifiquem, agora é só lançá-los ao vaso e... voilá!!!... Bendito vaso sanitário. Agora o próximo passo: avisar alguém... Não! Não alguém qualquer ... Paulo precisa saber o que está acontecendo aqui... Ora, mas que tolice a minha, amanhã é o dia de entrega do relatório anual da AmbiGen, não ocorre vigília ao pacote e vai direto para a CoMarx , preciso enviar o que tenho. Que pena que mandei os outros arquivos descarga abaixo, mas ele os encontrará depois de receber este meu presente.
06:06h – Pacote pronto, agora é só incluir na entrega da Marx. Isso é facílimo, só preciso esperar que venha para o meu setor... Ora, doutor Belmont, eu, sua maior aquisição, serei também a sua ruína... Que irônico!!!
Fim das minhas gravações... espero que isto chegue ao meu amigo Paulo e que ele me perdoe. Agora é hora de fazer o Projeto Alfa funcionar. Espero estar vivo depois disso.
· · ·
Um sibilo.
Inicialmente tímido e imperceptível, adentra a sala do 25º andar de edifício Marx. É um prenúncio... Um vento de mudança que torna o rosto de Paulo Henrique Marx cada vez mais austero.
Um último olhar sob a mesa, um pedido:
— Micarla?
— Sim, senhor Paulo?
— Quero uma equipe de mergulhadores pronta.
— Para quando, senhor?
— Pra ontem.
— Agora mesmo.
— Ah, Micarla, traga-me um café bem forte!
Capítulo 5 – RETROSPECTOS
Subterrâneos do Laboratório de Pesquisas Ambientais da AmbiGenTrês dias atrás
A cerca de 15 anos o AmbiGen foi criado. Era para ser um laboratório de pesquisas ambientais, no entanto, tudo isso é uma fachada, pois nos subterrâneos do laboratório reside um complexo científico que faz alterações genéticas e/ou eletrônicas em humanos e mutantes.O responsável por isso: Rafael Belmont; engenheiro genético e ambicioso homem que conseguiu, durante todo esse tempo, enganar a Corporação Marx fazendo-a injetar dinheiro para supostas pesquisas ambientais.Há mais ou menos um ano, muitas cobaias e experimentos começaram a fugir. Isso forçou Belmont a contratar um grupo de mercenários conhecidos como Cães de Guerra especializados em caçar mutantes. A situação piorou quando um grupo de jovens mutantes, que se autodenominou Geração M, começou a fazer ataques constantes a AmbiGen. No entanto, nada que a Geração M pudesse fazer preocupava Belmont, pois eles só conheciam o local por onde entraram e saíram dos subterrâneos, se eles tivessem descoberto que acima do laboratório está a sede da AmbiGen, a coisa teria sido diferente.Há cerca de 5 dias, a jovem grupo mutante, graças a Alan Rafael, o mutante Atlas, efetuou um ataque com coordenação e precisão tão impressionantes que deixariam o mais sábio dos generais de queixo caído... Mesmo assim, parecia que Belmont já sabia do ataque, pois passou o dia inteiro acompanhado de duas mutantes resultantes dos primeiros experimentos: Bélica e Miasma.Miccaelly e Michelly são gêmeas. Univitelinas. Mutantes desde o nascimento. Dentro do laboratório, Michelly fora modificada geneticamente e passou a controlar seus gases, conseguindo liberar doses variadas que podem desde afetar os sentidos, até matar quem os inale. Ela, que após seu período na AmbiGen, adotou o codinome de Miasma, matou a mãe e todos os médicos quando nasceu ao liberar seu gás tóxico durante o seu primeiro choro.
Na verdade, apenas a irmã sobreviveu. De alguma forma inexplicável, Miccaelly é imune aos gases mortais que sua irmã libera e também a qualquer outra forma de gás, além disso, Bélica – codinome adotado após descobrir sua capacidade mutante – é capaz de manusear completamente, sem aprendizado anterior, qualquer armamento e assimilar qualquer técnica de luta ou arte marcial simplesmente ao olhá-la.• • •20h.No exato momento em que a Geração M conseguiu adentrar no complexo, Miasma liberou seu gás tóxico capaz de distorcer os sentidos. Os primeiros atingidos pelo efeito do gás foram Atlas, Cynese e Muro. Com os sentidos atrapalhados, Muro atacou Sincronia; Bélica facilmente derrotou Codec e Decodificadora. Vendo a situação perdida, Refluxo e Pérola Negra começaram a tentar retirar seus colegas de lá. Protegendo-se do gás com uma máscara que habilmente retirou de um segurança, Refluxo procurou manter-se de frente para Bélica, impedindo-a de fazer ataques sem que tivesse seus atos revertidos.Os Cães de Guerra facilmente imobilizaram Atlas e Cynese que estavam desorientados devido ao gás de Miasma. Enquanto isso, Muro, descontrolado, derrubava mais 3 Cães de Guerra, os outros atiravam sem cessar... em vão, as balas causavam-lhe dor e até penetravam cerca de meio centímetro, mas nada causavam de dano a pele de Philipe Rubian, o mutante Muro.Somente o destino faria mudar os rumos da batalha e, neste momento, apesar de tudo, ela pendia de forma favorável para a Geração M, pois, mesmo Muro estando fora de controle, não havia quem pudesse pará-lo. Em meio à confusão, Pérola Negra retirou Sincronia e Decodificadora do complexo. Quando voltava para ajudar seus amigos, Fernanda foi vítima de destino: uma bala que ricocheteou na agora endurecida pele de Muro atingiu-lhe de raspão a fronte. Seus olhos foram ficando turvos e sua mente foi aos poucos se apagando. No último instante, num último esforço, Fernanda, lançou uma rajada psiônica concussiva que atingiu Miasma em cheio, fazendo-a desmaiar instantaneamente.
Ela ainda esperou, desejou que o destino lhe mostrasse a solução, tentou permanecer consciente até ver Muro aproximar-se de Refluxo que, neste momento, travava uma feroz batalha com a mutante capaz de aprender qualquer arte marcial, técnica de luta ou manusear qualquer armamento: Bélica... Fernanda desmaiou. Sua última visão: Muro aproximando por trás de Refluxo.O soco de Muro teria derrubado um prédio ou feito a cabeça de um homem comum tornar-se meros vestígios de sangue e miolos em sua mão. No entanto, ao acertar Refluxo, Muro teve seu poder rechaçado e o impacto do golpe o atinge com toda a força. Se não estivesse completamente transformado – algo que não acontece com muita freqüência, porque Rubian ainda não controla totalmente o seu poder –, estaria morto. Refluxo cambaleou, o golpe de seu colega não o atingiu com toda a força utilizada, porque no último instante, Felipe Cadó percebeu que ele estava por trás, mas, mesmo assim, foi forte o suficiente para fazê-lo desmaiar após ter cambaleado em direção a Bélica.Somente Sincronia e Decodificadora conseguiram escapar. Sob os ecos do fim de um intenso combate, uma gargalhada ressoa no 3º andar da AmbiGen... é Rafael Belmont.- Crianças incautas! Vocês achavam que conseguiriam me derrotar ou desfazer os meus planos e meu laboratório?!? HA! HA! HA! HA! HA! HA! Jamais! HA! HA! HA! HA! Eu sei de cada passo de vocês. Não há como me surpreender!!! HA! HA! HA!... Cães de Guerra, levem os prisioneiros para as celas.Olhares frios e sem emoção analisavam a situação, os outros membros do Conclave Interno, a elite de doutores que, junto com Rafael Belmont são os tutores da AmbiGen. Afastados da comitiva que recebeu a Geração M, apenas viam e juntavam notas sobre o acontecido. Em meio à frieza, uma exceção que não se fez notar: Erick Miller. Somente um olhar determinadamente desconfiado e atento teria percebido o papel amassado em seu punho cerrado e a expressão de asco misturada com raiva ao escutar as palavras de Belmont.
Há anos que Miller havia parado de tomar o coquetel de remédios que Belmont oferece ao conclave e aos outros membros. Um coquetel que tem, como única finalidade, suprimir uma parte do córtex cerebral que é responsável pela indicação de sentimentos, mas que os membros tomam porque Belmont os convenceu de que servia para a melhora do desempenho cerebral e a diminuição do cansaço físico. Quando descobriu o verdadeiro efeito, Erick passou a não tomar o coquetel e, desde então, além de ter que enganar a todos se mostrando alguém sem sentimentos, vem também ajudando diversos mutantes a fugirem do complexo subterrâneo. Alguns dos foragidos se juntaram e formaram a Geração M. agora, capturada e novamente sob os domínios de Belmont que não parava de falar:- Hoje é um grande dia! Foragidos recapturados... e, pelo que vejo, novas aquisições... tragam a moça de preto.Enquanto os Cães de Guerra levavam Pérola Negra até seu chefe, Erick ponderava sobre as palavras ditas.“Como ele sabia do ataque? Há um traidor entre os garotos?”Os pensamentos do jovem geneticista pareciam um amálgama de interrogações e suposições. Em meio a tudo, a figura de Belmont olhando-o fixamente quebrou-lhe o transe.- Tudo bem com você, Erick? Está suando!!! Sente-se bem?- S...sim, do-do... doutor! respondeu gaguejando e levando a mão à testa como se estivesse passando mal.- Levem-no a triagem, vejam o que há de errado com ele, mal se põe em pé.Era tudo o que Erick queria. A triagem era o único local do laboratório ao qual não tinha acesso. Agora, iria para lá e, mantendo-se fingindo, com certeza conseguiria as informações necessárias para um pensamento que lhe veio enquanto Belmont falava: “Será que as gêmeas russas têm algo a ver com o fato do doutor saber do ataque da GeraçãoM? Ora, afinal, a triagem era como uma ala médica simples, como todos falavam, para onde as cobaias iam para fazer exames de rotina, testes de doenças e possíveis anomalias congênitas...
Então por que as gêmeas Maria e Illia, especialistas em informática e robótica, estariam trabalhando lá a maior parte do tempo? Uma sonda rastreadora? Só podia ser isso!!!”Levado para a triagem , Erick estava disposto a fingir ao máximo para descobrir o mistério. No caminho, ainda escutou quando Belmont disse:- Preparem o laboratório! Protocolos código Alfa! Logo, logo receberemos visitas... Que dia!!!! Que dia maravilhoso!!!A gargalhada de Belmont ecoou por todo o complexo. Erick sentiu-se apreensivo: “O que estaria acontecendo para os protocolos Alfa serem utilizados?” No entanto, naquele momento, tudo que podia fazer era pensar sobre o assunto. Agora mesmo, o importante era descobrir como o doutor sabia do ataque da Geração M.
CAPÍTULO 6 - Protocolos Alfa e a triagem
“Aquelas aulas de teatro vieram bem a calhar e olha que eu dizia que nunca iria utilizá-las! Que irônico!!!”Enquanto pensava, Erick Miller era levado à triagem. Chegando lá, imediatamente começou a captar absolutamente tudo que falavam as gêmeas Illia e Maria, assim como o doutor Mendonça, um médico cardiologista e neuro-cirurgião que jamais saía da triagem.- O que houve com ele?- Sentiu-se mal e quase desmaiou agora a pouco - respondeu Illia.- Belmont mandou injetar-lhe uma nanorrastreadora - completou Maria- Em Erick Miller? O homem que o próprio Belmont considera quase um Deus - retrucou Mendonça em tom de apurado deboche.- O doutor está achando que ele, além de não estar tomando o coquetel, talvez seja responsável pela fuga dos mutantes - continuou Illia.- Miller, um traidor? Essa eu pagava pra ver!- Eu também não acredito muito nisso - falou Maria - Tudo que foi feito aqui tem a mão de Erick...- É... É difícil de acreditar que ele seja um traidor, mas eu não estou aqui para questionar e, sim, para cumprir ordens. Traga a pistola, Maria, por favor!- Sim, Mendonça! Só mais um pouco, estou instalando os nanodetectores na rastreadora... pronto!Com a pistola em mãos, Mendonça dirigiu-se até Erick que, num último instante, resolveu não reagir. Agora ela comprovara sua teoria, tudo que ele precisava era desativar a microespiã dentro de si e, de acordo com o que acabara de escutar, o aparelho era eletrônico. Então tudo que Erick precisava era de um P.E.M.*- Illia!- Sim, doutor!- Traga-me o coquetel intravenoso, apesar de que, se ele estiver a muito tempo sem tomar o composto, uma única dose não fará efeito.Um alívio imediato tomou conta de Erick, pois ele iria reagir e, com certeza, seria descoberto, mas nunca, nunca mesmo, gostaria de voltar a ser aquela pedra fria e sem sentimentos que um dia já fora.
Depois de um tempo, Mendonça fez a análise médica do paciente. Como já era de se esperar, disse que não havia nada de errado ou incomum e, como é de praxe aos médicos, colocou a causa do mal estar na possível falta de alimentação que, segundo o próprio paciente, ocorrera da última noite até agora.Neste momento, o “ator” Erick encontrava-se num leito na ala médica com uma dose de soro sendo-lhe injetada intravenalmente. Sentiu vontade de rir de tudo aquilo. Sabia que precisava urgentemente de um PEM, mas como produzi-lo sem despertar suspeitas? Não podia mais libertar os mutantes e meta-humanos cativos se não se livrasse primeiro da rastreadora em seu corpo.Sem poder fazer nada no momento, aproveitou e deitou-se para descansar, afinal só poderia sair depois que o soro acabasse.14hInício dos Protocolos Código AlfaApreensivo e nervoso. Essas duas palavras definem perfeitamente o estado de Rafael Belmont. Ordens são dadas com uma gama de nervosismo tão grande que chega a afetar até os selvagens Cães de Guerra. Tudo preparado. Elite de mercenários a postos, doutores em estado de observação e monitoramento. Quando a luz vermelha acima do terceiro andar começa a piscar, uma voz ecoa no complexo subterrâneo:- Iniciar protocolos Alfa.Um grito que efervesce a todos.Protocolos Alfa, uma série de medidas médicas e defensivas que o AmbiGen costuma adotar quando está adentrando em seu recinto um mutante Alfa ou um humano Alfa. Alfa é a denominação que todos usam no AmbiGen pra definir um patamar supremo de poder de um mutante; no caso de humanos, pode estar relacionado a um poder adquirido por meio científico ou mágico. Os protocolos foram criados depois que um mutante denominado E – 006 escapou do complexo. No entanto, desde a sua criação, somente uma única vez os protocolos Alfa foram acionados: quando capturaram o mutante Tundra. Era a primeira vez que um mutante com conhecimento do seu próprio poder havia sido capturado e trazido pra AmbiGen.
Ao entrar, Tundra tentou escapar, mas morreu em sua tentativa de fuga, não antes de matar sete seguranças e um médico.É a segunda vez que um protocolo Alfa é acionado, alguns poucos se lembram da primeira vez, mas todos sabem que suas vidas correm perigo.Os Cães de Guerra entram no complexo. Todos voltaram. Atrás deles, um maquinário que todos apelidaram de “última visão”, pois representa exatamente isso para quem é capturado: uma última visão do mundo lá fora como o conhecem. Aqui, sofrerão lavagem cerebral e modificações genéticas e até eletrônicas. Há duas bolhas de contenção ativas, dentro delas, os dois capturados, um humano e um mutante. O humano está acordado e se debate muito tentando de todas as formas atacar a bolha, o outro parece desmaiado. Não são dois idosos, há tempos que não são utilizados em experimentos... Nem dois homens ou adolescentes... Dessa vez, Belmont ultrapassou todos os limites da sanidade e da humanidade, nas bolhas há duas crianças.
*P.E.M. - Pulso Eletro-Magnético
Bem ... isso foi tudo que ele postou e eu copiei prá nosso blog ... quando ele colocar os próximos capítulos eu coloco em nova postagem .... valeu galera mutante.
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